02.02.2020
Mateus 1.23
“Vejam! A virgem ficará grávida! Ela dará à luz um filho [Cristo], e o chamarão Emanuel, que significa ‘Deus conosco’”.
A CONVERSÃO DE C. S. LEWIS
Clive Staples Lewis (1898-1963), mais conhecido como C. S. Lewis, tornou-se popular ao nos legar alguns clássicos da literatura cristã, dentre os quais (38 livros no total) se destacam: As Crônicas de Narnia, Cristianismo Puro e Simples e Cartas do Diabo ao seu Aprendiz. Fico feliz ao ver que, nos últimos tempos, muitas outras de suas obras, menos conhecidas, estão sendo pouco a pouco traduzidas e publicadas no Brasil.
Lewis, aos 18 anos, começou sua brilhante carreira acadêmica na Universidade de Oxford, ostentando a enorme autoconfiança de seu ateísmo. Logo teve que interromper os estudos para lutar na Primeira Guerra mundial. Dois anos mais tarde, aos 20, ele retornou para a universidade. Formou-se com louvor em letras e literatura aos 22, em Oxford, onde também se formou em teologia e linguística. Um verdadeiro gênio.
Para os amantes de literatura, fica um dado interessante: Lewis morreu no mesmo dia de Aldous Huxley (autor de Admirável Mundo Novo) e de John F. Kennedy (presidente dos Estados Unidos). A coincidência serviu como pano de fundo para o livro O Diálogo — Um debate além da morte entre John F. Kennedy, C. S. Lewis e Aldous Huxley (Mundo Cristão, 1986), de Peter Kreeft, onde os três personagens, representando o teísmo ocidental (Lewis), o humanismo ocidental (Kennedy) e o panteísmo oriental (Huxley), discutem sobre religião e cristianismo.
De volta a Lewis…
A raiva a um Deus em quem ele não mais cria existir parece ter surgido de uma experiência devastadora ainda na infância. O garoto teve uma infância admirável, que em sua autobiografia, Surpreendido pela Alegria (cap. 1, Os primeiros anos), Lewis a define com uma frase de Milton: “Feliz; mas, de tão feliz, vulnerável”.
De fato, pois aquela felicidade toda foi sendo interrompida à medida que Lewis assistia sua mãe, pouco a pouco, morrer de câncer. Ele orava a Deus para curar a mãe, mas suas palavras, ele sentia, caiam em ouvidos surdos e distantes. E antes mesmo de completar 10 anos, Lewis padeceu a morte de sua mãe.
Refletindo sobre aquele período, Lewis escreveu (págs. 23-24):
As crianças não sofrem menos (acho eu) que os mais velhos, mas sofrem de modo diferente. Para nós [ele e o irmão], meninos então, a verdadeira perda acontecera antes da morte de nossa mãe. Nós a perdemos de forma gradual, à medida que ela lentamente se retirava da nossa vida, nas mãos de enfermeiras, delírios e morfina, e à medida que toda a nossa existência se mudava em algo estranho e ameaçador, enquanto a casa era tomada de cheiros esquisitos, ruídos no meio da noite e sinistras conversas sussurradas.
A doença e a morte da mãe, nas palavras de Lewis, trouxe dois resultados imediatos: a perda emocional do pai e a união ao irmão. Escreveu (pág. 24):
[Meu pai] sempre fora uma pessoa nervosa, e suas emoções nunca foram das mais contidas. Sob a pressão da ansiedade [atenuada por causa da enfermidade e, finalmente a morte da esposa], sua fúria tornou-se constante; ele falava com destempero e agia injustamente. Assim, por uma crueldade peculiar do destino [note como Lewis começou a falar da providência de Deus: “uma crueldade peculiar do destino”], durante aqueles meses, esse homem infeliz, sem sequer o saber, perdia não só sua esposa, mas também os filhos.
Passávamos, eu e meu irmão, a depender cada vez mais exclusivamente um do outro para obter tudo aquilo que tornava a vida suportável; a ter confiança só um no outro. Acho que nós dois (ou pelo menos eu) já estávamos acostumados a mentir para ele [o pai]. Tudo aquilo que fazia daquela casa um lar agora nos faltava; tudo, exceto nós mesmos [os irmãos], um para o outro. A cada dia ficávamos mais próximos (e esse foi o resultado positivo) — dois moleques assustados e apertados um contra o outro em busca de calor num mundo frio.
O relato de Lewis sugere que sua relação com Deus não era pessoal e profunda o bastante. Na reflexão sobre as orações não respondidas, quando orou pela cura da mãe, mas Deus não o atendeu, ele anotou (pág. 25):
Eu havia abordado a Deus, ou minha ideia de Deus, sem amor, sem espanto, até sem temor. Ele deveria, na imagem mental que eu fazia desse milagre, aparecer não como Salvador ou Juiz, mas meramente como mágico; e quando já tivesse feito o que dele se exigia, eu supunha que ele iria simplesmente… ora, ir embora.
A perda da mãe para o câncer (e a perda emocional do pai), afundou o mundo de Lewis. Ele conclui o primeiro capítulo de sua autobiografia com essas palavras (pág. 26):
Com a morte de minha mãe, toda a felicidade serena, tudo o que era tranquilo e confiável, desapareceu da minha vida. Estavam por vir muita diversão, muitos prazeres, muitas punhaladas da Alegria; mas nada da velha segurança. Agora tudo era mar e ilha; o grande continente afundara com Atlântida.
No decurso dos anos seguintes à morte da mãe, Lewis foi gradativamente descartando a ideia de um Deus cuidadoso e amoroso, além de relegar a Bíblia ao canto dos livros de histórias. Enquanto estudante, muito antes de assumir a cadeira de professor de Literatura Inglesa, Medieval e Renascentista na Universidade de Cambridge, seu ateísmo floresceu no solo de Oxford, durante seus anos de estudos. Mas de vagar e sempre, como costumamos dizer, Deus o estava arrancando suas raízes do solo ateu, chacoalhando a terra do ceticismo e colocando-o em liberdade.
Lewis, no entanto, resistia com suas raízes bem fincadas no solo da autoconfiança. Mas os solavancos de Deus eram sempre firmes e fortes. Falando desse processo, ele registrou que “era como um homem que perde ‘apenas um peão’ e nem sonha que isso (nesse momento do jogo) significa xeque-mate em poucas jogadas”. Descrevendo a ansiedade causada pela persistência de Deus, ele escreveu:
A raposa havia sido desalojada da floresta hegeliana [i.e., corrente filosófica que pode ser sintetizada por uma frase do próprio filósofo G. W. F. Hegel: “O racional por si só é real”] e agora corria em campo aberto, enlameada e cansada, perseguida por cães de caça a poucos metros de distância.
Lewis usou outra imagem vívida para descrever seu processo de conversão:
E assim o grande Pescador brincava com Seu peixe e eu nem sonhava que o anzol estivesse fisgado na minha língua.
Finalmente, Deus jogou sua rede; o peixe continuou se debatendo e resistindo, mas a disputa chegou ao final com o xeque-mate divino (págs. 202-203):
O leitor precisa imaginar-me sozinho naquele quarto em Magdalen [Oxford], noite após noite, sentindo — sempre que minha mente se desviava um instante que fosse do trabalho — a aproximação firme e implacável dele, aquele que com tanta determinação eu não desejava encontrar. Aquilo que eu temia tanto pairava afinal sobre mim. Cedi enfim no período letivo subsequente à Páscoa de 1929 [com cerca de 20/30 anos de idade], admitindo que Deus era Deus, e ajoelhei-me e orei; talvez, naquela noite, o mais deprimido e relutante converso de toda a Inglaterra. Não percebi então o que se revela hoje a coisa mais ofuscante e óbvia: a humildade divina que aceita um converso mesmo em taís circunstâncias.
O Filho Pródigo afinal caminhava para casa com as próprias pernas. Mas quem é que pode respeitar de fato o Amor que abre os portões a um pródigo que é arrastado para dentro esperneando, lutando ressentido e girando os olhos em torno, à procura de uma chance de fuga? As palavras compelle intrae, forçá-lo a entrar, foram tão violentadas por homens impiedosos que chegamos a estremecer diante delas; mas, entendidas de forma correta, determinam a profundidade da misericórdia divina. A dureza de Deus é mais suave que a suavidade dos homens, e sua coerção é nossa libertação.
E naquela noite, Jesus se tornou o Deus e Salvador de C. S. Lewis, “o mais relutante dos pecadores.”
VISÃO DA GLÓRIA DE CRISTO
O que chama minha atenção nesta parte da biografia de Lewis, dentre tantas outras coisas maravilhosas, é a raiz de toda a incredulidade do menino que cresceu e por 20 anos (dos 9/10 aos 29/30 anos) viveu fugindo de Deus. Você percebeu? Permitam-me ler, mais uma vez, o que ele escreveu na página 25 de Surpreendido pela Alegria:
Eu havia abordado a Deus, ou minha ideia de Deus, sem amor, sem espanto, até sem temor. Ele deveria, na imagem mental que eu fazia desse milagre [a cura da mãe; a ressurreição da mãe], aparecer não como Salvador ou Juiz, mas meramente como mágico; e quando já tivesse feito o que dele se exigia, eu supunha que ele iria simplesmente… ora, ir embora.
Tudo bem que, mesmo que não justifique, Lewis não passava de um garoto, contado entre 8 e 10 anos de idade, fragilizado diante da enfermidade e morte da mãe. Mas verdade seja dita: Quantas não são as pessoas — jovens e velhos, crianças e adultos — que criam uma ideia de Deus, imaginando-o um mágico operador de milagres, sem nutrir por ele qualquer sentimento de amor, espanto e temor; alguém que simplesmente tem que vir a nós na hora que o chamamos, fazer o que dele exigimos e esperar que ele imediatamente vá embora e nos deixe curtir a vida do nosso jeito.
Não é sem razão, portanto, que milhares e milhares de religiosos, num momento ou outro da vida, seja por causa da dor ou do prazer, decepcionados com Deus ou simplesmente indiferentes, alguns declaradamente e outros com vergonha de dizer, simplesmente viram as costas para Deus e se enveredam pelas florestas do ceticismo, cinismo, ateísmo, materialismo, hedonismo, espiritualismo e outros “ismos” humanos em busca de viver a própria vida, tentando ser feliz conforme for possível.
A falta de encanto pela glória de Cristo, a falta de um relacionamento recheado de amor, estimulado pelo espanto e regulado pelo temor de quem Deus é na pessoa de Cristo é a raiz de todos os males da alma, do corpo, da família, dos relacionamentos e da sociedade. A raiz dos males da humanidade não é o mal que cometemos uns contra os outros. A raiz de todo mal é buscar satisfação final em qualquer coisa que não seja Deus — mesmo que seja uma boa causa, como, por exemplo, a cura da mamãe.
Pense comigo. Veja como Jesus definiu fé salvadora. João 6.35:
Respondeu Jesus: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim nunca mais terá fome. Quem crê em mim nunca mais terá sede.”
A fé salvadora é um “vir”. Agora, é óbvio que não se trata de um ato físico. Não é que devemos caminhar até algum lugar, até porquê Jesus agora está no céu. Trata-se de um ato espiritual: “vir” espiritualmente. Nós vamos no coração. Vamos a Jesus para matar a sede da nossa alma — os anseios da nossa alma, as dores da nossa alma. Vamos a Jesus para nos satisfazer nele, em quem ele se revela ser. Isto é fé. Isto é fé salvadora. E é por isto que a fé é algo tão poderoso para mudar a sua vida. Também é por isto que tantas pessoas não são mudadas, porque elas não têm fé — essa fé, esse “vir” para matar a fome e a sede em Jesus Cristo. Transformamos a fé em algo intelectual, num ato da vontade, força de vontade que não tem poder em si mesmo, não produz resultados duradouros e, portanto, muitas partes da Bíblia não fazem sentido. Deus fica sem graça. Um “mágico” sem graça, desmancha-prazeres.
Se você é cristão, seu coração e sua alma chegaram a Jesus e o abraçaram como a satisfação de sua sede e de sua fome. É isto o que significa ser cristão, ter fé salvadora. Encontrar sua satisfação final em qualquer outro lugar ou em qualquer outra coisa, exceto em Deus, em quem Deus é e promete ser para nós em Cristo, é a essência do mal. A essência do mal, todo mal — o que torna o mal realmente mau — é que sempre envolve buscar mais prazer em algo que não seja Deus.
Exagero? Abra em Jeremias 2.12–13. Leia (NAA):
12Fiquem espantados com isto, ó céus! Fiquem horrorizados e cheios de espanto”, diz o Senhor. 13“Porque o meu povo cometeu dois males: [1]abandonaram a mim, a fonte de água viva, e [2]cavaram cisternas, cisternas rachadas, que não retêm as águas.”
Essa é uma definição incrível de mal, não é verdade? Vai direto ao coração de todo mal. Pense em algo mal. Escolha um mal. Somos tão humanistas, tão centrados no homem, no eu, que pensamos que o verdadeiro mal é quando você machuca alguém. Esse não é o verdadeiro mal. O verdadeiro mal, se você machuca alguém, é que pessoas são criadas à imagem de Deus. Não toque em Deus! O mal tem a ver com Deus.
O que faz do mal o mal é isto: aqui está Cristo, e ele está neste lugar, e ele se oferece agora mesmo como a fonte de água viva para cada um de vocês. “Eu sou uma fonte inesgotável de água totalmente satisfatória.” E se você disser: “Deixe-me provar de você, Jesus — deixe-me provar!”, e depois afirmar: “Eu não gostei do que eu provei! Vou cavar um poço pra mim.”, você é mau.
Escolha uma pessoa má das páginas da história. É isto que você é: Se você provar de Cristo, afastar-se de Cristo, ou mesmo se recusar a beber de Cristo, que se oferece a cada um de nós como fonte de água viva, saiba que esta é a essência de todo o mal. O mal está em se provar de Cristo e preferir algo mais. E a razão pela qual o mundo está na condição em que está é porque Adão e Eva cometeram esse mal. E todos nós herdamos esse mal e nascemos amando outras coisas mais do que Cristo.
Prova de que é verdade é que talvez você não consiga dizer de boca cheia: “Para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro.” (Fl 1.21). A essência do mal é que Cristo não é o lucro. Quando Cristo é o lucro, quando nos encantamos com ele, bebemos dele, comemos dele, vivemos dele e para ele, vivemos como ele, não há mal que sobreviva ou que nos resista. Até mesmo a morte se torna lucro.
Se C. S. Lewis já tivesse essa visão, lá na infância quando perdeu a mamãe, ele não teria virado as costas para Deus após a morte da mãe. Se você tiver essa visão de Cristo na sua vida, do Cristo vivo e glorioso, você buscará nele satisfação e viverá satisfeito nele. E é com o fim de que isto seja a sua vida — a visão da glória de Cristo como o deleite do seu coração — que estamos estudando esta série de mensagens.
Hoje, o que aprenderemos, no pouco tempo que nos resta, é que Jesus não é um mágico ao nosso dispôr, alguém que vem, realiza os nossos desejos e depois se vai, deixando-nos em paz. Nada disso! Cristo é Deus-homem, homem-Deus. Portanto, estudaremos a glória das duas naturezas de Cristo para o encanto do seu coração.
Ore a Deus. Peça a ele que, assim como os discípulos, você veja a glória das duas naturezas de Cristo na mesma pessoa e creia, indo a ele com desejo de se satisfazer nele. Ouça como foi com os discípulos. João 2.11:
Esse sinal em Caná da Galileia foi o primeiro milagre que Jesus fez [transformou água em vinho]. Com isso ele manifestou sua glória, e seus discípulos creram nele.
Peça agora mesmo que Cristo manifeste a você a glória das suas duas naturezas — homem e Deus — na mesma pessoa, e que assim você creia e se satisfaça para sua eterna salvação e progressiva santificação.
Vejamos, pois, alguns exemplos de humanidade e divindade em Cristo.
EXEMPLOS DE HUMANIDADE E DIVINDADE
Entre todos, permitam-me destacar apenas quatro exemplos pelos quais Jesus demonstra sua humanidade e imediatamente, na mesma cena, estampa a sua divindade. Talvez você nunca tenha notado. Limitaremos a um exemplo por evangelho. Veja e via.
Mateus 14.22-33:
22Logo em seguida, Jesus insistiu com seus discípulos que voltassem ao barco e atravessassem até o outro lado do mar, enquanto ele despedia as multidões. 23Depois de mandá-las para casa, Jesus subiu sozinho ao monte a fim de orar. Quando anoiteceu, ele ainda estava ali, sozinho. 24Enquanto isso, os discípulos, distantes da terra firme, lutavam contra as ondas, pois um vento forte havia se levantado. 25Por volta das três da madrugada, Jesus foi até eles, caminhando sobre as águas.
26Quando os discípulos o viram caminhando sobre as águas, ficaram aterrorizados. “É um fantasma!”, gritaram, cheios de medo. 27Imediatamente, porém, Jesus lhes disse: “Não tenham medo! Coragem, sou eu!”. 28Então Pedro gritou: “Se é realmente o senhor, ordene que eu vá caminhando sobre as águas até onde está!”. 29“Venha!”, respondeu Jesus. Então Pedro desceu do barco e caminhou sobre as águas em direção a Jesus. 30Mas, quando reparou no vento forte e nas ondas, ficou aterrorizado, começou a afundar e gritou: “Senhor, salva-me!”. 31No mesmo instante, Jesus estendeu a mão e o segurou. “Como é pequena a sua fé!”, disse ele. “Por que você duvidou?”
32Quando entraram no barco [Pedro e Jesus; Pedro tentou andar sobre as águas, indo ao encontro de Jesus, mas fracassou], o vento parou. 33Então os outros discípulos o adoraram e exclamaram: “De fato, o senhor é o Filho de Deus!”.
Deus não ora. Somente os homens oram. Homens não andam sobre as águas. Somente Deus anda sobre as águas. Segundo Mateus, Jesus Cristo fez as duas coisas: orou e andou sobre as água. Jesus é Deus-homem, homem-Deus. Isto é fabuloso.
Marcos 1.40-42:
40Um leproso veio e ajoelhou-se diante de Jesus, implorando para ser curado: “Se o senhor quiser, pode me curar e me deixar limpo”. 41Cheio de compaixão, Jesus estendeu a mão e tocou nele. “Eu quero”, respondeu. “Seja curado e fique limpo!” 42No mesmo instante, a lepra desapareceu e o homem foi curado.
Homens, criados a imagem e semelhança de Deus, sentem compaixão. Mas somente Deus tem poder para curar apenas com palavras. Segundo Marcos, Jesus fez as duas coisas: sentiu compaixão e curou. Jesus é Deus-homem, homem-Deus. Isto é glorioso.
Lucas 8.22-25:
22Certo dia, Jesus disse a seus discípulos: “Vamos para o outro lado do mar”. Assim, entraram num barco e partiram. 23Durante a travessia, Jesus caiu no sono. Logo, porém, veio sobre o mar uma forte tempestade. O barco começou a se encher de água, colocando-os em grande perigo. 24Os discípulos foram acordá-lo, clamando: “Mestre, Mestre, vamos morrer!”. Quando Jesus despertou, repreendeu o vento e as ondas violentas. A tempestade parou, e tudo se acalmou. 25Então ele lhes perguntou: “Onde está a sua fé?”. Admirados e temerosos, os discípulos diziam entre si: “Quem é este homem? Quando ele ordena, até os ventos e o mar lhe obedecem!”.
Deus não sente sono, não dorme, nem precisa ser acordado. Homens sim. Homens não repreendem vento e ondas, fazendo parar a tempestade, acalmando tudo e todos. Deus sim. Segundo Lucas, Jesus Cristo fez todas essas coisas: ficou cansado, dormiu pesado e precisou ser acordado; depois, ele parou a tempestade com uma simples repreensão. Jesus é Deus-homem, homem-Deus. Isto é maravilhoso.
João 11.32-35:
31Quando as pessoas que estavam na casa viram Maria sair apressadamente, imaginaram que ela ia ao túmulo de Lázaro chorar e a seguiram. 32 Assim que chegou ao lugar onde Jesus estava e o viu, caiu a seus pés e disse: “Se o Senhor estivesse aqui, meu irmão não teria morrido”. 33Quando Jesus viu Maria chorar, e o povo também, sentiu profunda indignação [perturbação] e grande angústia. 34“Onde vocês o colocaram?”, perguntou. Eles responderam: “Senhor, venha e veja”. 35Jesus chorou.
Perturbação. Angústia. Choro. Tudo coisa de homens. Sim, Deus se entristece. Deus se ira. Mas perturbação, angústias e lágrimas são coisas da terra, de homens. Deus não tem esse tipo de sentimento. Outra coisa: Deus não faz esse tipo de pergunta: “Onde vocês o colocaram?” Homens perguntam assim, Deus não!
Ainda na mesma cena, João 11.38-44:
38Jesus, sentindo-se novamente indignado, chegou ao túmulo, uma gruta com uma pedra fechando a entrada. 39“Rolem a pedra para o lado”, ordenou. “Senhor, ele está morto há quatro dias”, disse Marta, a irmã do falecido. “O mau cheiro será terrível.” 40Jesus respondeu: “Eu não lhe disse que, se você cresse, veria a glória de Deus?”. 41Então rolaram a pedra para o lado. Jesus olhou para o céu e disse: “Pai, eu te agradeço porque me ouviste. 42Tu sempre me ouves, mas eu disse isso por causa de todas as pessoas que estão aqui, para que elas creiam que tu me enviaste”. 43Então Jesus gritou: “Lázaro, venha para fora!”. 44E o morto saiu, com as mãos e os pés presos com faixas e o rosto envolto num pano. Jesus disse: “Desamarrem as faixas e deixem-no ir!”.
Homens tiram pedra de túmulos, mas somente Deus, com apenas uma voz de comando, grita e faz um morto reviver. Eu amo o que li de um pregador simples do campo comentou sobre este texto, destacando o poder divino da ordem do Senhor: “Se Jesus não tivesse limitado a sua voz de comando a Lázaro, todos os corpos daquele cemitério teriam saído dos túmulos.”
Que momento eletrizante! Imagine como deve ter sido o jantar na casa de Lázaro naquela noite! O fato é que apenas homens se entristecem a ponto de chorar e somente Deus pode dizer a um morto: viva, e ele vive. Segundo João, Jesus fez os dois: chorou e ressuscitou Lázaro.
G. Campbell Morgan (1863-1945), pastor que antecedeu Martyn Lloyd-Jones (1899-1981) na Capela de Westminster em Londres, Inglaterra, debatendo com o mistério da encarnação de Jesus Cristo, certa vez escreveu:
Cristo é o Deus-homem. Não é Deus habitando em um homem. Desse tipo há vários nas mais diversas expressões de religiosidade e espiritualidade pelo mundo. Cristo é o Deus-homem. Não um homem deificado. Desse tipo não há, salvo nos mitos pagãos. Cristo é Deus e homem, combinando em uma só Pessoa as duas naturezas — humana e divina, um enigma e um mistério perpétuos, desconsertando qualquer possibilidade de explicação.
João, fazendo o comentário final de seu Evangelho, anotou (Jo 21.24-25):
24Este é o discípulo que dá testemunho destes acontecimentos e que os registrou aqui. E sabemos que seu relato é fiel. 25Jesus também fez muitas outras coisas. Se todas fossem registradas, suponho que nem o mundo inteiro poderia conter todos os livros que seriam escritos.
Não haveria material o bastante para conter o registro de quem Cristo é e o que ele fez. Definitivamente, argumenta João, Cristo é Deus que se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade. E quem vê a sua glória e se encanta com ela e nela se satisfaz recebe perdão e salvação.
A GLÓRIA DAS DUAS NATUREZAS DE CRISTO
Charles Swindoll publicou num de seus livros o trecho de uma carta, narrando um fato real, escrita por uma professora do jardim de infância.
A professora conta que resolveu, no primeiro dia de aula, testar o conhecimento cristão dos aluninhos. Na turminha, ele logou notou um menino para quem a história de Jesus era completa novidade. Narrando a história do evangelho, ela chegou à morte de cruz. O garoto perguntou o que era cruz. A professora pegou algumas lascas de madeira no pátio da escola e confeccionou uma rude cruz. Explicou ao garoto que Jesus foi pregado e morreu numa cruz como aquela. Foi quando o pequeno aprendiz baixou seu olhar e sussurrou: “Ah, não! Isso é muito ruim!” No mesmo compasso, a professora completou e disse que, após ser sepultado, Jesus ressuscitou ao terceiro dia, está vivo e virá buscar todo aquele que nele crê. Os olhos do garoto se arregalaram de espanto, ele se levantou do chão e exclamou: “TOTALMENTE INCRÍVEL!”
Você não conhece a verdadeira identidade de Jesus se você para no suspiro que diz: “Ah, não! Isso é muito ruim!”. Você só conhece a verdadeira identidade de Jesus, de uma forma salvadora, se você é capaz de dizer: “TOTALMENTE INCRÍVEL!”.
A importância das duas naturezas de Cristo
Por que importa que Cristo combine essas duas naturezas numa só pessoa: humana e divina? Sendo Cristo Deus, ele é capaz de
A conjunção dessas duas coisas é o que torna Cristo unicamente glorioso. Wayne Grudem coloca essa maravilha numa frase: “Permanecendo o que era, tornou-se o que não era.” Em outras palavras: enquanto Jesus “permanecia” o que era (plenamente Deus), ele também se tornou o que não fora antes (plenamente homem). Jesus não deixou nada de sua divindade quando se tornou homem, mas assumiu a humanidade que antes não lhe pertencia.
Pois bem, depois de percebermos que Jesus é plenamente homem e plenamente Deus, e que sua natureza humana permanece plenamente humana e sua natureza divina permanece plenamente divina, podemos ainda perguntar se algumas qualidades ou capacidades foram dadas (ou “comunicadas”) de uma natureza a outra. Parece que a resposta é sim. [Sigo aqui argumentos de Wayne Grudem – Teologia Sistemática, que por sua vez está na esteira de John Owen no livro A Glória de Cristo].
Da natureza divina para a natureza humana: Ainda que a natureza humana de Jesus não tenha mudado em seu caráter essencial, porque ela foi unida por milagre à natureza divina na pessoa única de Cristo, a natureza humana de Jesus obteve (a) dignidade para ser cultuada e (b) incapacidade de pecar, elementos que não pertencem, de outra maneira, aos seres humanos. Pense, portanto, na dignidade conferida à pessoa humana, especialmente ao Cristão que pela fé se une à Cristo; pense também na segurança eterna de nossa salvação — unidos à Cristo pela fé, unidos à natureza de Cristo, jamais cairemos do estado de glória no céu.
Da natureza humana para a natureza divina: A natureza humana de Jesus lhe deu (a) a capacidade de experimentar o sofrimento e a morte; (b) a capacidade de ser nosso sacrifício substitutivo, o que Jesus, só como Deus, não poderia ter feito. Pense, mais uma vez, na aplicação desta doutrina: alguém que nos conhece a fundo e se compadece de nós e que viveu a vida sem pecado no nosso lugar, morreu e ressuscitou, comprando a nossa salvação.
Isso tudo é muito glorioso! Ouçam as palavras de Wayne Grudem, em conclusão ao capítulo intitulado “A Pessoa de Cristo” em sua Teologia Sistemática:
Ao final desta longa discussão, pode-nos ser fácil perder de vista o que de fato é ensinado nas Escrituras. Trata-se, de longe, do milagre mais maravilhoso de toda a Bíblia — muito mais maravilhoso que a ressurreição e até que a criação do universo. O fato de o Filho de Deus, infinito, onipresente, onisciente, onipresente e eterno tornar-se homem e unir-se para sempre a uma natureza humana, de modo que o Deus infinito se tornasse uma só pessoa com o homem finito, permanecerá pela eternidade como o mais profundo milagre e o mais profundo mistério em todo o universo.
Venha, pois, a Cristo. Encante-se com a glória dele. Sacie-se nele. E sua alma viverá, sobreviverá aos temporais desta vida, e chegará segura ao céu, à presença gloriosa de Cristo, quando, então o veremos face a face.
S.D.G. L.B.Peixoto
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