18.08.2024
Êxodo 6.2-8 (NVT)
2Deus também disse a Moisés: “Eu sou Javé, ‘o SENHOR’. 3Apareci a Abraão, Isaque e Jacó como El-Shaddai, ‘o Deus Todo-poderoso’, mas não lhes revelei meu nome, Javé. 4Estabeleci com eles a minha aliança, mediante a qual prometi lhes dar a terra de Canaã, onde viviam como estrangeiros. 5Esteja certo de que ouvi os gemidos dos israelitas, que agora são escravos dos egípcios, e me lembrei da aliança que fiz com eles.
6“Portanto, diga ao povo de Israel: ‘Eu sou o SENHOR. Eu os libertarei da opressão e os livrarei da escravidão no Egito. Eu os resgatarei com meu braço poderoso e com grandes atos de julgamento. 7Eu os tomarei como meu povo e serei o seu Deus. Então vocês saberão que eu sou o SENHOR, seu Deus, que os libertou da opressão no Egito. 8Eu os levarei à terra que jurei dar a Abraão, Isaque e Jacó. Eu a darei a vocês como propriedade. Eu sou o SENHOR!’”.
TEATRO. Você já foi ao teatro? Gosta de assistir a peças teatrais? Infelizmente, pouquíssimas pessoas têm apetite para esse tipo de arte. A gente brasileira é mais de programas de auditório, filmes, novelas, seriados de televisão ou séries de plataformas de streaming – são as plataformas de transmissão contínua, tipo, por exemplo, a Netflix. Teatro, para a maioria de nós, não passa de um local – o edifício – aonde se vai para ver a apresentação de filhos e netos em idade escolar, no máximo para ver alguma apresentação musical. Mas isto a gente sabe: teatro é um local para ver. E estamos certos, pois quando se estuda o significado etimológico do substantivo “teatro”, descobre-se que ele vem do termo grego “theatron”, cuja tradução é – adivinha? – “lugar para ver”. Ora, se é assim, então o mundo é um teatro. Digo, a totalidade das coisas que existem – nos céus e na terra – é tudo um edifício, um teatro (no sentido mesmo do termo teatro): um lugar para ver.
William Shakespeare é famoso não apenas pelas suas grandes peças teatrais, tais quais Romeo e Julieta, Hamlet, Macbeth, Otelo, etc. Esse poeta, dramaturgo e ator inglês, do final do século XVI e início do século XVII (falecido em 1616), é famoso também por algumas de suas frases. Uma delas é extraída de um poema da comédia intitulada Do jeito que você gosta (As You Like It). Esta é a frase, dita por Jaques, um viajante melancólico: “O mundo é um palco e todos os homens e mulheres são na verdade atores”.
A comparação entre a vida humana em sociedade e o teatro parece ser um lugar-comum na literatura. Para se ter uma ideia, o famoso teatro Globe de Londres (1599–1642), que era de propriedade de William Shakespeare, tinha como emblema Hércules, um semideus da mitologia grega. Na logo do teatro, Hércules estava suportando o mundo nas costas, com uma inscrição em latim – “Totus mundus agit histrionem” – cuja tradução é “o mundo inteiro atua como ator”.
Não se apresse em dizer que isto é bobagem ou coisa vulgar.
João Calvino, reformador protestante que também viveu no século XVI (1509–1564), em suas Institutas da Religião Cristãs, tratou as obras de Deus, o mundo criado como sendo o “formosíssimo teatro de Deus”, destinado a que dele se colha “piedoso deleite”, uma vez que nele brilha intensamente “a glória de Deus”. Escreveu ainda que
na ordem da natureza esta é a primeira: para onde quer que volvamos os olhos em derredor, devemos ter em mente que todas as coisas que nossos olhos divisam são obras de Deus, e ao mesmo tempo devemos refletir, em piedosa consideração, a que fim foram por Deus criadas.
“[A] que fim foram por Deus criadas”? Calvino mesmo explicou: “este magnífico teatro do céu e da terra, saturado de maravilhas incontáveis, de cuja contemplação se nos impunha sabiamente conhecer Deus.” Isto mesmo, o teatro da criação tem como fim o conhecer a Deus, o ver a glória de Deus e nela nos deliciarmos. No entanto, é pena que, escreveu o reformador de Genebra,
atolada em seus erros, cega, em meio a tão magnífico teatro, a maioria se mostra, exclama o salmista, que de rara e singular sabedoria é o ponderar judiciosamente essas obras de Deus [Salmo 107.43], de cuja simples contemplação nada aproveitam aqueles que, de outra sorte, sagacíssimos parecem ser. E de fato, por mais que refulja a glória de Deus, dificilmente um em cem lhe é verdadeiro espectador.
O teatro da criação, no entanto, não é suficiente.
Conhecer a Deus de modo suficiente requer outro modo de revelação. Há, portanto, outro teatro no plano de Deus: a Bíblia Sagrada. — E por quê? — Calvino escreveu:
por mais que ao homem, com sério propósito, convenha volver os olhos a considerar as obras de Deus, uma vez que foi colocado neste esplendíssimo teatro para que fosse seu espectador, todavia, para que fruísse maior proveito, convém-lhe, sobretudo, inclinar os ouvidos à Palavra.
Ah!, meu povo! Deus se revela glorioso tanto na obra da criação como na revelação da Palavra. As duas coisas são obra sobrenatural e poderosa do mesmo Deus; e elas se completam, sendo que a revelação bíblica explica com precisão a obra da criação – sua origem, seu estado, desenrolar e o futuro. Desse modo, a frase de Shakespeare – “o mundo inteiro atua como ator” – capta bem como a Bíblia apresenta este mundo: um palco feito por Deus, um teatro edificado para encenar a grande história da história humana. E a Bíblia mesma é também um teatro repleto de comédia e de tragédia, na verdade, mais do que jamais entraram na mente fértil de William Shakespeare. Sobretudo, a Bíblia (e também toda a criação) é um teatro para a manifestação da glória de Deus.
A GLÓRIA DE DEUS é, de fato, a mensagem de toda a Bíblia. Por exemplo: poderíamos nos aprofundar neste tema não apenas em Êxodo (livro que estamos nos propondo a estudar a partir desta noite), mas também em todo o Antigo e o Novo Testamento juntos, demonstrando que se tratam de uma grande exibição da glória de Deus – o teatro da glória de Deus. Desse modo, a glória de Deus é também o tema dos primeiros cinco livros da Bíblia, que são chamados de Pentateuco ou, às vezes, de Lei (a lei de Moisés), uma vez que contêm os Dez Mandamentos (e centenas de outros mandamentos!).
O PENTATEUCO começa em Gênesis, com a obra de Deus na criação, a queda do ser humano (representado em Adão) no tão ruinoso pecado, suas consequências e o grande plano de Deus para o mundo – salvar um povo através de aliança com Abraão e a sua descendência. Consideramos tudo isso e muito mais em nosso estudo na série de nove mensagens em Gênesis (Gênesis: A Aliança, de outubro de 2023 a março de 2024).
Os outros quatro livros do Pentateuco – Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio – contam a história dos descendentes de Abraão, desde o tempo que passaram no Egito até pouco antes de entrarem na terra prometida: Canaã. Desse modo, os cinco primeiros livros da Bíblia compõem o palco, edificam o teatro em que será revelada a glória de Deus na aliança com Abraão (Gênesis), a redenção de Israel do Egito – através de Moisés (Êxodo), a santidade do povo formado por Deus em aliança (Levítico), a purificação desse povo no deserto do Sinai (Números) e a renovação da aliança entre Deus e o povo, antes de entrarem na terra prometida de Canaã (Deuteronômio).
Gênesis, o primeiro livro da Bíblia, começou com o relato da majestosa criação dos céus e da terra, mas terminou de forma fúnebre com o caixão de José, descendente de Abraão, no Egito. Trágico se esse fosse realmente o fim da história. Só que, pelas palavras do próprio patriarca, nunca se perdeu entre os hebreus a esperança de uma futura libertação do SENHOR Deus. Ouçam, o finalzinho de Gênesis:
Gênesis 50.22-26 (NVT)
22José, seus irmãos e suas famílias continuaram a viver no Egito. José viveu 110 anos. 23Chegou a ver três gerações de descendentes de seu filho Efraim e o nascimento dos filhos de Maquir, filho de Manassés, os quais ele tomou para si como se fossem seus.
24José disse a seus irmãos: “Em breve morrerei, mas certamente Deus os ajudará e os tirará desta terra. Ele os levará de volta para a terra que prometeu solenemente dar a Abraão, Isaque e Jacó”.
25Então José fez os filhos de Israel prestarem um juramento e disse: “Quando Deus vier ajudá-los e conduzi-los de volta, levem meus ossos com vocês”. 26José morreu com 110 anos. Os egípcios o embalsamaram e o colocaram em um caixão no Egito.
Ora, Êxodo, portanto, é a continuação do teatro da glória de Deus. Ou seja; fecharam-se as cortinas com o caixão de José no Egito; mas na sequência elas foram abertas para os novos atos de Deus – que está conduzindo com soberana providência a grande história da humanidade, a maior das história da humanidade: a história da redenção. E, sim, a julgar pela tão majestosa criação (cf. Gn 1 e 2), Deus jamais terminaria esta peça com um de seus atores embalsamado em um caixão, com as esperanças mortas com ele e que jamais seriam concretizadas (cf. Gn 50.22-26). Esse não é o caráter de Deus, do Deus da Bíblia. Deus não nos criou para a morte, mas para a vida com ele, eternamente.
Sim, como já estudamos em Gênesis 3, o pecado no qual nós caímos, por livre escolha e vontade, separou-nos de Deus (da árvore da vida no paraíso; cf. Gn 3.22-26), mas em Cristo tudo isso será resgatado no final desta etapa da história. Se você tem alguma dúvida, veja o último ato da grande peça da história da redenção narrada na Bíblia. Note como a obra de Cristo – seu sangue derramado como propiciação, expiração, pagamento pelos pecados de todos quantos creem – nos abriu um caminho de volta para aquilo que o povo de Deus havia perdido no pecado: o paraíso (tão esplendida, exuberantemente criado em Gênesis 1 e 2).
Apocalipse 22.14-21 (NVT)
14Felizes aqueles que lavam suas vestes. A eles será permitido entrar pelas portas da cidade e comer do fruto da árvore da vida. […]
17O Espírito e a noiva dizem: “Vem!”. Que todo aquele que ouve diga: “Vem!”. Quem tiver sede, venha. Quem quiser, beba de graça da água da vida. […]
20Aquele que é testemunha fiel de todas essas coisas diz: “Sim, venho em breve!”.
Amém! Vem, Senhor Jesus!
21Que a graça do Senhor Jesus esteja com todos.
Jesus mesmo deixou muito claro que a sua vida e obra visaram a nos reconduzir ao paraíso da presença de Deus, sustentados pela árvore da vida. Você se lembra do que Cristo disse ao criminoso arrependido, que estava pregado ao lado dele lá na cruz? Ouça: Lucas 23.43 (NVT), “Eu lhe asseguro que hoje você estará comigo no paraíso”. A morte de Cristo, portanto, sua vida e obra, nos reconduz ao paraíso perdido em Gênesis 3, o paraíso da presença de Deus. Mas eu estou me adiantando.
Começa-se a contar a história desse resgate em Gênesis mesmo. Por exemplo: Gênesis 3.15 (NVT), “Farei que haja inimizade entre você e a mulher, e entre a sua descendência e o descendente dela. Ele lhe ferirá a cabeça, e você lhe ferirá o calcanhar”. Esse descendente seria da semente de Abraão, conforme se lê em Mateus 1.1-2, 16 (NVT), abrindo o Novo Testamento: “Este é o registro [lit., γενεσις] dos antepassados de Jesus Cristo, descendente de Davi e de Abraão: Abraão gerou Isaque. […] Maria deu à luz Jesus, que é chamado Cristo.” Daí se justifica o chamado de Deus feito a Abraão:
Gênesis 12.1-2 (NVT)
1O SENHOR tinha dito a Abrão: “Deixe sua terra natal, seus parentes e a família de seu pai e vá à terra que eu lhe mostrarei. 2Farei de você uma grande nação, o abençoarei e o tornarei famoso, e você será uma bênção para outros.
Essa aliança feita com Abraão foi reforçada em Gênesis 15.17-20. Só que a história do Gênesis, longe de terminar no paraíso, acabou em um caixão no Egito. — Como assim?! — É que o final de Gênesis é apenas a conclusão do primeiro ato de Deus na história da redenção. Êxodo é o segundo ato.
Êxodo é o registro do nascimento de Israel como nação, e o caixão de José no Egito nada mais é do que o tipo, a imagem de um “ventre” protegido por Deus. E desse ventre bem guardado pelo próprio Deus de Abraão, Isaque e Jacó, a família judaica será exponencialmente multiplicada de apenas setenta até atingir o número de milhares. Deus disse que seria assim, que o Egito seria o “ventre” da graça de Deus. Recorde:
Gênesis 46.1-5, 26 (NVT)
1Jacó partiu para o Egito com todos os seus bens. Quando chegou a Berseba, ofereceu sacrifícios ao Deus de Isaque, seu pai. 2Durante a noite, Deus lhe falou numa visão. “Jacó! Jacó!”, chamou ele.
“Aqui estou!”, respondeu Jacó.
3“Eu sou Deus, o Deus de seu pai”, disse a voz. “Não tenha medo de descer ao Egito, pois lá farei de sua família uma grande nação. 4Descerei com você ao Egito e certamente o trarei de volta. E José estará ao seu lado quando você morrer.”
5Então Jacó saiu de Berseba, e seus filhos o levaram para o Egito.
[…]
26No total, 66 descendentes diretos de Jacó foram com ele para o Egito, sem contar as esposas de seus filhos.27Além deles, José teve dois filhos que nasceram no Egito, totalizando setenta membros da família de Jacó no Egito.
No momento certo, acompanhada de severas “dores de parto”, a infante nação, contando entre dois e três milhões de pessoas (cf. Êx 12.37-38), virá à luz do mundo para continuar sendo, pela providência divina, protegida, alimentada e fortalecida – até que nascesse o descendente de Abraão, o Cristo, o Messias prometido de Israel.
Agora, sobre o livro especificamente. Êxodo.
O TÍTULO HEBRAICO (o título da Bíblia dos hebreus), que é extraído das primeiras palavras do livro, é exatamente o que se lê no comecinho: “Estes são os nomes” (Êx 1.1, NVT). Sim, a primeira frase de Êxodo é o título mesmo do livro: We’ elle Shemoth, traduzindo: “Estes são os nomes”. Pena que nenhuma de nossas traduções tenha feito questão de manter a conjunção com a qual Moisés mesmo, inspirado pelo Espírito, começou o texto – a conjunção aditiva “E”. Portanto, a tradução literal e, consequentemente, o título verdadeiro do livro é este: “E estes são os nomes”. — Por que se importar com esta conjunção aditiva? — Esta conjunção está aqui para mostrar que Êxodo é a continuação de Gênesis. A história continuou; e este segundo ato – o Êxodo – está posto para revelar como Deus agiu para cumprir a aliança que havia feito com Abraão. Releia:
Êxodo 6.2-8 (NVT)
2Deus também disse a Moisés: “Eu sou Javé, ‘o SENHOR’. 3Apareci a Abraão, Isaque e Jacó como El-Shaddai, ‘o Deus Todo-poderoso’, mas não lhes revelei meu nome, Javé. 4Estabeleci com eles a minha aliança, mediante a qual prometi lhes dar a terra de Canaã, onde viviam como estrangeiros. 5Esteja certo de que ouvi os gemidos dos israelitas, que agora são escravos dos egípcios, e me lembrei da aliança que fiz com eles.
6“Portanto, diga ao povo de Israel: ‘Eu sou o SENHOR. Eu os libertarei da opressão e os livrarei da escravidão no Egito. Eu os resgatarei com meu braço poderoso e com grandes atos de julgamento. 7Eu os tomarei como meu povo e serei o seu Deus. Então vocês saberão que eu sou o SENHOR, seu Deus, que os libertou da opressão no Egito. 8Eu os levarei à terra que jurei dar a Abraão, Isaque e Jacó. Eu a darei a vocês como propriedade. Eu sou o SENHOR!’”.
ÊXODO, PORTANTO, É SOBRE A REDENÇÃO, o grande resgate, a libertação de Israel do Egito, o qual já havia cumprido o papel divino de “ventre” protegido por Deus para trazer ao mundo o seu povo. Nessa esteira, o título grego, – o título que nós usamos para o livro – “Êxodo”, significa exatamente isto: êxodo ou emigração, partida, saída. A tradução do hebraico bíblico (que era a língua do Antigo Testamento) para o grego comum (que era a língua franca da época), a Septuaginta (LXX) extraiu o título “Êxodo” de Êxodo 19.1 (NVT), onde se lê que “Exatamente dois meses depois de saírem [ἐξόδου] do Egito [lit., “depois do êxodo do Egito], chegaram ao deserto do Sinai.” ESTE, POIS, É O TEMA DE ÊXODO: a saída do Egito, a redenção, o grande resgate, a libertação de Israel, dando continuidade à aliança feita com Abraão e que será chancelada no Sinai, com a entrega da Lei a Moisés – para o estabelecimento de Israel enquanto nação.
Êxodo 19.5-6 (NVT)
5Agora, se me obedecerem e cumprirem minha aliança, serão meu tesouro especial dentre todos os povos da terra, pois toda a terra me pertence. 6Serão meu reino de sacerdotes, minha nação santa’. Essa é a mensagem que você deve transmitir ao povo de Israel”.
Êxodo 24.7 (NVT)
Depois, pegou o Livro da Aliança e o leu em voz alta para o povo. Mais uma vez, todos responderam: “Obedeceremos ao SENHOR! Faremos tudo que ele ordenou!”.
Israel foi redimida para viver em comunhão com o Deus glorioso. Tanto é assim que o livro termina com estas palavras:
Êxodo 40.34-38 (NVT)
34Então a nuvem cobriu a tenda do encontro, e a glória do SENHOR encheu o tabernáculo. 35Moisés não podia mais entrar na tenda do encontro, pois a nuvem estava sobre ela, e a glória do SENHOR a enchia.
36Sempre que a nuvem se levantava de cima do tabernáculo, os israelitas seguiam viagem. 37Mas, se a nuvem não se levantava, permaneciam onde estavam até a nuvem se elevar. 38Durante o dia, a nuvem do SENHOR pairava no ar acima do tabernáculo e, à noite, fogo ardia dentro da nuvem, de modo que todo o povo de Israel podia vê-la. E isso ocorreu ao longo de todas as jornadas dos israelitas.
Viver em aliança tendo em seu meio um Deus assim tão glorioso requererá do povo de Israel santidade, sobre a qual tratará o livro de Levítico (que estudaremos em algum momento no ano que vem, Deus permitindo).
Permitam-me, agora, apresentar a vocês um breve panorama do livro, demonstrando que o Êxodo traz aos nossos olhos a história da redenção – da escravidão para a vida em comunhão com o Deus santo e glorioso de Abraão, Isaque e Jacó, o Deus de Israel.
Observe que a estrutura de Êxodo já aponta para os temas principais do livro. Essencialmente, são dois: [1. 1.1–18.27] Deus liberta seu povo da opressão no Egito e o preserva no deserto do Sinai [2. 19.1–40.18] com o propósito de que Israel ratifique a aliança e o adore na terra. Desse modo, permitindo o SENHOR, à partir do próximo domingo à noite, nós olharemos para o palco montado por Deus em Êxodo, atentando-nos para, buscando ver as seguintes cenas:
TRÊS COISAS ficarão muito claras para nós ao longo dessas cenas. PRIMEIRO: Deus opera soberanamente. Ele é o ator supremo e o agente decisivo dessa história. SEGUNDO: Deus opera soberanamente para salvar para si um povo especial. TERCEIRO: O propósito para Deus operar soberanamente para salvar para si mesmo um povo especial é a sua própria glória. Leland Ryken colocou desta forma o objetivo do livro:
Êxodo conta a história da saída de Israel do Egito e de seu estabelecimento como nação. Porém, o autor tem em mente um propósito ainda maior, a saber, o engrandecimento da glória de Deus na salvação de Seu povo. O grande problema no início do livro é a incapacidade dos israelitas de saírem e glorificarem a Deus, pois Faraó queria manter o trabalho deles todo para si. Daí o motivo explicitamente declarado de Deus de resgatar os israelitas: Eu serei glorificado em Faraó, e em todo o seu exército, e nos seus carros, e nos cavaleiros (Êx 14.17b). Há manifestações visíveis e descrições do esplendor da glória de Deus ao longo do livro: na sarça ardente (Êx 3.1-6), no cântico no mar (Ex 15.11), no deserto (Ex 16.10) e no monte Sinai (Ex 24.16; 33.18-23). Todavia, o auge está bem no final, quando a nuvem cobriu a tenda da congregação, e a glória do SENHOR encheu o tabernáculo (Êx 40.34).
Pois bem, como se já não fosse o bastante o que vimos até aqui, pergunto a você: por que estudar Êxodo? Tony Merida apresenta os seguintes pontos práticos:
PRIMEIRO, estudaremos Êxodo para conhecer melhor a Deus. Êxodo é sobre Deus, o Deus soberano e glorioso! Por exemplo:
Salmo 66.5-7 (NVT)
5Venham e vejam as obras de Deus!
Que feitos notáveis ele realiza em favor das pessoas!
6Abriu um caminho seco pelo meio do mar,
e seu povo atravessou a pé;
ali nos alegramos nele.
7Com seu grande poder, ele governa para sempre
e vigia cada movimento das nações;
que nenhum rebelde se levante contra ele.
Venham e vejam! Veremos que Deus deseja ser conhecido e glorificado. Veremos que Deus é o Deus de compaixão e misericórdia, que é lento para se irar e cheio de amor e fidelidade (Êx 34.6). Ao encontrar esse Deus santo, devemos, como Moisés, no mesmo instante, curvar-nos e adorá-lo (Êx 34.8).
SEGUNDO, estudaremos Êxodo para entender melhor a redenção oferecida por Deus. Êxodo é uma imagem do evangelho, e procuraremos compreender Êxodo em relação a Jesus. Existem várias razões para isso, mas destaco apenas uma. Em Lucas 24, Jesus explicou o Antigo Testamento conduzindo seus discípulos “por todos os escritos de Moisés e dos profetas, explicando o que as Escrituras diziam a respeito dele.” (v. 27). “Moisés” aqui é a abreviação de Pentateuco, que inclui Êxodo! Anteriormente, em Lucas 9.31, quando Jesus conversou com Moisés e Elias no Monte da Transfiguração, Lucas registrou que Jesus falou sobre sua “morte” (lit. sua “partida”), e a palavra ali é exodos, a palavra grega para “Êxodo”. Sim, a morte e ressurreição triunfantes de Jesus foram o êxodo maior. Jesus passaria pelas águas da morte para libertar seu povo da escravidão de seus pecados e levá-los para os novos céus e nova terra. No Novo Testamento, Jesus também é referido como “nosso Cordeiro pascal”, usando a terminologia do Êxodo (1Co 5.7).
O Êxodo, portanto, fornece o modelo primário de redenção no Antigo e no Novo Testamento e permanece como uma das chaves para a compreensão da cruz e da salvação. Observe algumas das semelhanças entre Israel e os crentes de hoje:
Tal como Israel, somos salvos de alguma coisa (da escravidão ao pecado) para alguma coisa (testemunhar e adorar). Essa ideia de ser levado para “fora do Egito” é registrada muitas vezes na Bíblia (Êx 3.10; 3.17; 20.2; Sl 81.10; Mt 2.15; Jd 5). Outra coisa, tal como Israel, somos salvos pelo sangue de um cordeiro, o Cordeiro de Deus: Cristo (Êx 12; 1Pe 1.18-19; Ap 5). E ainda: tal como Israel, fomos salvos e agora somos peregrinos, um sacerdócio santo, procurando glorificar a Deus em palavras e ações até chegarmos à terra prometida (1Pe 2.4-12). Com tudo isso em mente, podemos dizer que, em certo sentido, a história do Êxodo é a nossa história.
TERCEIRO, estudaremos Êxodo para entender melhor a missão de Deus (e a nossa). A missão da igreja não começa na Grande Comissão (Mt 28.16-20). Ela começa bem antes deste texto para nós tão importante. De fato, a missão de Deus começa no Antigo Testamento. E em Êxodo nós vemos Deus preocupado sim com a injustiça física sofrida pelo seu povo, mas principalmente preocupado como com a libertação espiritual de seu povo. Precisamos ser um povo que se importa com os escravizados, tanto física quanto espiritualmente. Christopher J. H. Wright diz bem: “A redenção moldada pelo Êxodo exige uma missão moldada pelo Êxodo”. O Êxodo nos dá não apenas um modelo de redenção, mas também um modelo de missão – o que nos leva ao último ponto.
QUARTO, estudaremos Êxodo para entender melhor a prática da vida cristã. De fato, podemos tirar lições muito preciosas deste livro. Temos em Êxodo tanto exemplos a se evitar como exemplos a se seguir. Paulo escreveu assim, em 1Coríntios 10.11 (NVT): “Essas coisas que aconteceram a eles [cenas extraídas de Êxodo… essas coisas que aconteceram a eles] nos servem como exemplo. Foram escritas como advertência para nós, que vivemos no fim dos tempos.” Portanto, em Êxodo, vários tópicos práticos deverão nos interessar e à medida que nos detivermos nas cenas estampadas nas páginas deste livro incrível, buscaremos entender e aplicar a narrativa de Êxodo de forma histórica, teológica, cristológica, missiológica e prática. Que a jornada comece!
Encerrando, deixo-vos as palavras de Mark Dever, ao concluir o sermão panorâmico que ele pregou no livro de Êxodo à sua igreja:
E o fim último de tudo isso é a glória de Deus! Deus pretende que a sua criação o veja como ele é, para que todos possam reconhecê-lo, temê-lo, obedecê-lo, louvá-lo e amá-lo. É disso que trata o Êxodo. Isso desafia as nossas ideias de Deus como um servo passivo e igualitário, não é? De acordo com Êxodo, Deus salva soberanamente um povo especial para a sua própria glória.
Foi por isso que Deus conduziu os israelitas através das circunstâncias de suas vidas, e é por isso que ele também conduz você através das circunstâncias de sua vida. Você ainda não está morto. A história da sua vida não acabou. Você pode até estar neste momento de sua vida no mesmo momento exaustivo em que os israelitas estavam enquanto trabalhavam arduamente naquele período que antecedeu a chegada de Moisés. Não perca a esperança! Não desista da fé nas promessas que Deus fez. Oro para que você também aprenda a temer, servir e amar somente ao Deus resgatador – não para sua própria glória e fama, mas para a dele. A glória de Deus foi vista no Êxodo; foi demonstrada ainda mais claramente em Cristo; e hoje ela se manifesta na vida de seu povo [Calvino chama a Igreja de “teatro” da sabedoria de Deus]. Que responsabilidade! Que privilégio! Por que mais viveríamos?
S.D.G. L.B.Peixoto
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