04.12.2016
“MAGNIFICAT” – O CÂNTICO DE MARIA
Lucas 1.46-55
46 Então disse Maria: “Minha alma engrandece ao Senhor 47 e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, 48 pois atentou para a humildade da sua serva. De agora em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada, 49 pois o Poderoso fez grandes coisas em meu favor; santo é o seu nome. 50 A sua misericórdia estende-se aos que o temem, de geração em geração. 51 Ele realizou poderosos feitos com seu braço; dispersou os que são soberbos no mais íntimo do coração. 52 Derrubou governantes dos seus tronos, mas exaltou os humildes. 53 Encheu de coisas boas os famintos, mas despediu de mãos vazias os ricos. 54 Ajudou a seu servo Israel, lembrando-se da sua misericórdia 55 para com Abraão e seus descendentes para sempre, como dissera aos nossos antepassados”.
Os primeiros hinos cristãos
O Natal de Jesus é a festa do cântico e da música, e Lucas é o primeiro hinologista da história da igreja – a primeira pessoa versada no estudo de hinos e de cânticos cristãos. Para o médico amado, o Evangelho é musical, por isso que há cinco Cânticos de Natal registrados neste Evangelho:
Estudiosos dos Evangelhos consideram esses poemas musicais registrados por Lucas como sendo “os últimos dos salmos hebraicos e os primeiros dos hinos cristãos”.
A esta altura, penso que pelo menos duas perguntas precisam ser respondidas: (1) Por que o estilo poético? e (2) Por que tanta música?
O estilo poético – A poesia é uma forma elevadíssima de expressão. Ela nos força a diminuir o ritmo, e somente quando nós desaceleramos a mente e o coração, concentrando-nos em reflexão, é que somos capazes de compreender, sorver, saborear e regozijar na mensagem que está sendo comunicada.
A música – O que Deus fez em Cristo Jesus requer de nós louvor e adoração. Não é suficiente simplesmente entender e dizer o que Deus fez para nos salvar. Não basta compreender a obra da salvação. Ela precisa ser celebrada com salmos, hinos e cânticos espirituais, pois é cantando e salmodiando que a alma melhor se expressa e mais se deleita no objeto da adoração.
Sobre a importância da música, Aristóteles documentou o que segue:
A música, usada dignamente, é um dos meios mais eficientes para a educação e a instrução de um povo… Ela tem tanta relação com a formação do caráter, que precisamos ensiná-la às crianças.
“Magnificat” – O Cântico de Maria
Estudando o Cântico de Isabel ou Beatitude, descobrimos que benditos, bem-aventurados ou felizes são aqueles que permitem a obra de Deus em suas vidas, que se submetem ao plano do Senhor para eles, que se oferecem para, pela fé, carregarem em si o Salvador.
Hoje nós olharemos para o Cântico de Maria ou Magnificat e, porque o seu cântico é uma belíssima expressão de sua fé e de seu amor pelo Deus da sua salvação, nós aprenderemos quatro lições sobre adoração: o conteúdo da adoração; a forma da adoração; o motivo da adoração; o objeto da adoração.
1. O conteúdo da adoração
Lendo cuidadosamente o Cântico de Maria, é possível notar um fato importantíssimo: o seu poema está encharcado de passagens bíblicas do Antigo Testamento. Além de ecos do Cântico de Ana (mãe de Samuel – 1Sm 2), cada palavra ou expressão do texto parece ser uma citação direta ou uma alusão a alguma passagem do cânon hebraico.
Ela cita pelo menos doze livros: Gênesis, Êxodo, Deuteronômio, 1 e 2 Samuel, Jó, Salmos, Isaías, Ezequiel, Miqueias, Habacuque e Zacarias. Ao todo, são cerca de 40 citações. A Palavra de Deus realmente habitava com riqueza no seu coração (Cl 3.16).
Importante ressaltar que não eram simples citações, não havia distorções teológicas ou de contexto para se provar um pretexto, nada disso. Maria, com idade entre 14 e 16 anos, já conhecia apropriadamente os textos e a teologia do Antigo Testamento. Naquele tempo, lia-se, memorizava-se, meditava-se e estudava-se as Escrituras desde a mais jovem idade.
Deve ser bíblico o conteúdo da adoração.
Quando lemos as cartas do Novo Testamento, descobrimos que a igreja primitiva utilizava-se da música com conteúdo bíblico com pelo menos três propósitos singulares: comunicar verdades teológicas (Fl 2.6-11); fixar conteúdos bíblicos (Cl 3.16); e expressar louvor e adoração (Ef 5.19). Portanto, deve ser bíblico o conteúdo da adoração.
Atente-se comigo para o testemunho de Martinho Lutero.
Sabe-se que o pai da Reforma Protestante foi um homem de música e de oração. Diz-se que ele orava regularmente duas horas todos os dias e sempre que tinha muita coisa para fazer ele dobrava para quatro horas o seu tempo em oração. Para Lutero a oração é a maior obra do crente e um elemento chave da vida cristã, por isso ele pregava exatamente aquilo que vivia, ou seja: “quem trabalha muito deve orar em dobro”.
Orar, no entanto, não era algo fácil para ele. Escrevendo ao seu barbeiro, Pedro Beskendorf, sobre como se deve orar, ele compartilhou com humildade:
Às vezes sinto que, por causa de ocupações ou de pensamentos alheios, fiquei frio ou perdi a vontade de orar. Pois a carne e o diabo estão constantemente dificultando e impedindo a oração.
Impressionante que até mesmo um gigante da fé como Lutero, ninguém menos que o pai da Reforma, sofreu com o desânimo e lutou para não deixar de orar. Daí a lição: o que fazer quando não sentimos vontade de orar? O testemunho de Lutero é inigualável. Ele diz assim:
Nesses momentos pego meu Livro Sagrado, vou para o meu quarto ou, conforme o dia e a hora, procuro um cantinho sossegado e passo a recitar para mim mesmo, oralmente, trechos dos Salmos, os Dez Mandamentos e, dependendo de minha disponibilidade de tempo, diversas citações de Cristo, de Paulo, ou dos Profetas, tudo como o fazem as crianças.
Perceba que para Lutero a oração é fruto da Palavra pela fé e a resposta do coração humano à mensagem do Evangelho revelada nas Escrituras. A mesma coisa com a adoração. Ainda sobre como lutar em oração, Lutero escreveu:
É bom que, de manhã cedo, se faça da oração a primeira atividade; e da noite, a última. E previne-te muito bem desses pensamentos falsos e enganosos que dizem: ‘Espera um pouco, daqui a uma hora vou orar, mas antes ainda tenho que resolver isto ou aquilo.’ Porque com esse pensamento se passa da oração para os afazeres que prendem e envolvem a gente a ponto de não mais sair oração o dia inteiro.
O coração e a mente não estão naturalmente prontos para se dedicarem inteiramente à oração ou à adoração. Precisamos, segundo Lutero, aprender a aquecê-los com a recitação oral dos textos bíblicos, pregando às nossas almas. Sejam os Salmos, os Evangelhos, a Lei, ou os textos apostólicos, toda a Escritura, inspirada por Deus, é apta para nos ensinar e nos estimular na prática da oração e da adoração.
Da próxima vez que você for orar ou cantar, em casa ou na igreja, prepare-se: estando você com ou sem vontade de fazê-lo, siga as dicas do reformador. Abra o texto bíblico e leia pausadamente, pegando um ponto depois do outro, refletindo sobre o que Deus nele exige de você, identificando nele razões para ações de graças, deixando-o expor os pecados que precisam ser confessados, e assim por diante, fazendo de cada trecho um motivo de oração ou de louvor. Continuará sendo difícil, mas, orando e adorando como Lutero, será muito mais deleitosa a sua vida de oração e de adoração.
Deve ser bíblico o conteúdo da adoração.
2. A forma da adoração
Quando Maria discerne o cumprimento das promessas de Deus, quando ela identifica o mover do Senhor na vida dela, através dela e naqueles que estão ao redor dela, todo o seu conteúdo intelectual trabalha fazendo mover alma e espírito, ou seja: o seu coração.
Lc 1.46-47 | 46 Então disse Maria: “Minha alma engrandece ao Senhor 47 e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, (…)
A verdadeira adoração, o louvor que agrada a Deus é o que brota do coração. A mente e os lábios não são suficientes. É de coração que se adora a Deus (Is 29.13): em espírito – com alma, com ânimo, com as emoções; e em verdade – com entendimento e compreensão bíblicos ( Jo 4.24).
Deve ser de coração a forma da adoração. Por quê? Porque só de coração é que se honra alguém e se não for expressa de coração a alegria não se completa. C. S. Lewis, no livro Reflexões sobre os Salmos, colocou da seguinte forma, observe:
O fato mais óbvio sobre louvor – seja a Deus ou a qualquer coisa – estranhamente me escapou. Eu pensava nisso em termos de elogio, aprovação, ou de prestação de honra. Eu nunca tinha percebido que todo prazer espontaneamente transborda em louvor a menos que… a timidez ou o medo de chatear os outros deliberadamente apareça. O mundo ressoa em louvor – amantes louvando seus amados, leitores seu poeta favorito, caminhantes louvando a paisagem, jogadores louvando seu jogo favorito – louvor ao clima, vinhos, pratos, atores, carros, cavalos, faculdades, países, personagens históricos, aos filhos, flores, montanhas, selos raros, besouros raros, às vezes até mesmo à políticos ou estudiosos. Eu não tinha notado como as mentes mais humildes, e ao mesmo tempo mais balanceadas e capacitadas, louvavam mais, enquanto as excêntricas, desajustadas e insatisfeitas louvavam menos…
Eu não tinha notado também que, assim como homens espontaneamente louvam qualquer coisa que eles valorizam, eles também nos encorajam a se juntar a eles em louvor a isso: “Ela não é adorável? Não foi glorioso? Você não acha aquilo magnífico?” Os Salmistas quando dizem para todos louvarem a Deus, estão fazendo o que todos os homens fazem quando eles falam do que se importam. Toda a minha, mais geral, dificuldade sobre o louvor a Deus dependia da minha negação absurda a nós, no que diz respeito ao supremamente Valioso, daquilo que nos deleitamos em fazer, do que de fato não podemos deixar de fazer, do que nós valorizamos acima de tudo.
Eu acho que nós nos deleitamos em louvar o que apreciamos, porque o louvor não meramente expressa, mas completa o gozo; é a sua consumação. Não é por elogio que casais continuam dizendo um ao outro quão bonitos eles são; o deleite está incompleto até ser expressado.
Agora, como continuar adorando quando eu sinto que não é de coração? Como adorar de coração se não tenho vontade? Permitam-me sugerir algumas dicas:
Olhe para Jesus com expectativa. Não se concentre em seu coração sem vida. Em vez disso, olhe para Cristo com fé, confiando nele para encontrá-lo, ajudá-lo e mudá-lo. Olhe para Cristo com fé nas Escrituras. Leia. Memorize. Medite.
Ore e peça-lhe que o ajude a adorar. Seja honesto com ele sobre a frieza do seu coração. Confesse qualquer pecado conhecido e tenha a certeza do perdão baseado na obra final de Cristo na cruz. Então peça mais do trabalho do Espírito em seu coração para permitir que você sinta um alegre louvor, um espanto assombroso e um desejo sincero por ele.
Coloque seu coração na revelação de quem Deus é em Cristo. Se a adoração é fogo, então a verdade revelada é o combustível que faz com que o fogo queime. Quanto mais combustível, mais quente o fogo. Portanto, concentre-se em oração e implacavelmente na verdade das canções, nas orações, nas Escrituras.
Persevere nas etapas acima – pacientemente. Deus pode mudar seu coração instantaneamente – ou não. Mas o tempo de Deus para você é tudo de melhor, de agradável e de perfeito para você. Humildemente continue esperando por ele. Esperar por Deus glorifica-o da mesma forma que exaltá-lo; pois se sabe que nada mais poderá nos satisfazer; nesse caso, o desejo funciona como o deleite.
3. O motivo da adoração
Além do conteúdo (bíblico) e da forma da adoração (coração), Maria nos ensina o motivo da adoração. Pode-se ver no cântico três motivos principais para a adoração.
3.1. A graça salvadora
Lc 1.46-49 | 46 Então disse Maria: “Minha alma engrandece ao Senhor 47 e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, 48 pois atentou para a humildade da sua serva. De agora em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada, 49 pois o Poderoso fez grandes coisas em meu favor; santo é o seu nome.
3.2. A justiça divina
Lc 1.50-53 | 50 A sua misericórdia estende-se aos que o temem, de geração em geração. 51 Ele realizou poderosos feitos com seu braço; dispersou os que são soberbos no mais íntimo do coração. 52 Derrubou governantes dos seus tronos, mas exaltou os humildes. 53 Encheu de coisas boas os famintos, mas despediu de mãos vazias os ricos.
3.3. A providência soberana
Lc 1.54-55 | 54 Ajudou a seu servo Israel, lembrando-se da sua misericórdia 55 para com Abraão e seus descendentes para sempre, como dissera aos nossos antepassados”.
Nossa adoração deve ser pelo que Deus é e pelo que ele faz.
4. O objeto da adoração
Maria revela que o objeto da sua adoração não era outro senão o Senhor e Salvador Jesus Cristo.
Lc 1.46-47 | 46 Então disse Maria: “Minha alma engrandece ao Senhor 47 e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, (…)
A adoração deve ter como objeto o Deus Trino: o Pai amoroso, o Filho gracioso e o Espírito consolador. A alegria dos homens deve ser Jesus (Bach), soberano Senhor e amoroso Salvador.
“Magnificat” – O Cântico de Maria
No cântico “Beatitude”, de Isabel, nós aprendemos que felizes são os que se submetem a Deus, carregando neles o Salvador.
Agora, no cântico Magnificat, de Maria, nós vimos que alegria plena é para aqueles que, tendo recebido o Salvador, vivem para magnificar, engrandecer, adorar, em espírito e em verdade, ao Deus de toda graça.
Neste Natal, receba Jesus no seu coração e cante como Maria. Experimente a alegria de louvar a Deus. Não há sentimento igual.
46 “Minha alma engrandece ao Senhor 47 e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador,
Feliz Natal!
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