23.02.2020
Tiago 1.13-18
13 Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: “Estou sendo tentado por Deus”. Pois Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. 14 Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido. 15 Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte. 16 Meus amados irmãos, não se deixem enganar. 17 Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, que não muda como sombras inconstantes. 18 Por sua decisão ele nos gerou pela palavra da verdade, a fim de sermos como que os primeiros frutos de tudo o que ele criou.
O problema do sofrimento
Sobre o cristianismo, duas coisas, principalmente, ofendem profundamente os mais céticos. Primeiro, o exclusivismo que diz que Jesus Cristo é o único caminho e a única verdade. Segundo, a presença do mal e do sofrimento no mundo.
Tentando responder a estas e outras indagações, Timothy Keller, ex-pastor da Igreja Presbiteriana Redentor em Nova Iorque e autor best-seller do New York Times, escreveu um livro fenomenal. Todo cristão deveria ler e reler o seu trabalho. Chama-se “A fé na era do ceticismo. Como a razão explica Deus”, publicado no Brasil pela editora Vida Nova.
No primeiro capítulo do livro, ele ataca a primeira das grandes dúvidas da humanidade contemporânea: “Não pode haver somente uma religião verdadeira”. No capítulo seguinte, ele volta a sua artilharia para a questão do sofrimento: “Como um Deus bondoso pode permitir o sofrimento?”.
Falando sobre o problema do sofrimento, Keller narra a angustiante indagação de um casal de namorados, os dois estudantes universitários em Nova Iorque, que revela bem o que muita gente pensa. A moça se chama Hillary e o rapaz Rob. Ouça.
Hillary – Simplesmente não acredito na existência do Deus do cristianismo. Deus permite sofrimentos terríveis no mundo. Ou ele é todo-poderoso, mas não bondoso o bastante para pôr fim ao mal e ao sofrimento, ou ele é todo-poderoso, mas não poderoso o bastante para pôr fim ao mal e ao sofrimento. Seja como for, o Deus todo-bondoso e todo-poderoso da Bíblia não existe.
Rob – Para mim não se trata de uma questão filosófica. É uma questão pessoal. Não creio em um Deus que permita o sofrimento, ainda que ele exista. Talvez Deus exista. Mas, se ele existe, não é confiável.
A sabedoria de Tiago
O problema do mal e do sofrimento, definitivamente, atormenta muita gente, fazendo as pessoas questionarem a bondade, a credibilidade e até a razoabilidade da existência de Deus. Tiago, já nos primeiros anos do cristianismo, percebia esse problema.
Ele sabia que, na tentativa de fortalecer e edificar os cristãos sob seus cuidados, a primeira coisa que ele deveria fazer em sua cartilha para iniciantes no cristianismo era dar uma resposta coerente ao problema do sofrimento. Tanto que, já no primeiro capítulo, do versículo 2 ao 13, o tema é o mesmo: provações e tentações, ou seja: o problema do sofrimento.
A forma como Tiago aborda o problema do sofrimento é de uma sabedoria que merece destaque. Veja…
Tg 1.2-4 | Os benefícios do sofrimento.
Tg 1.5-8 | A necessidade de sabedoria para a hora do sofrimento.
Tg 1.9-12 | O sofrimento à luz da eternidade.
A essa altura de seu argumento, Tiago poderia ter seguido sua carta com outros temas importantes para a caminhada cristã. No entanto, ele dá um passo além no problema do sofrimento. Nos versículos 13 a 18 (que é o nosso texto de hoje) ele aborda o problema do sofrimento a partir do coração do sofredor.
Em Tiago 1.2-12 nós vemos o problema do sofrimento a partir das circunstâncias e dos acontecimentos — são as provações. Agora, em Tiago 1.13-18 nós enxergamos o problema do sofrimento a partir do coração do sofredor — são as tentações (as tentações que as provações acabam se tornando para aqueles que sofrem). Tiago é simplesmente brilhante!
Tendo falado sobre o cristão consciente, maduro, sábio e saudável, Tiago agora discorrerá sobre o cristão aprovado — aquele que, além de atravessar as provações, vence as tentações com louvor. É o cristão aprovado.
Sobre o cristão aprovado, há pelo menos três lições para as quais eu chamo a sua atenção nesta manhã. O cristão aprovado…
– Reconhece a fonte da tentação;
– Compreende o mecanismo da tentação;
– Resiste ao progresso da tentação.
Por que nós pecamos (o problema do mal no mundo)? De onde vêm as tentações (desejos e comportamentos maldosos)? Tiago deixa claro que a culpa pelas tentações (que são os desejos e os comportamentos pecaminosos) e pelo pecado (que é todo o mal no mundo) não é de Deus.
Tg 1.13,17 | 13 Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: “Estou sendo tentado por Deus”. Pois Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. (…) 17 Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, que não muda como sombras inconstantes.
Deus não é autor do pecado (do mal), nunca teve nem tem intenção de nos fazer pecar (de nos fazer agir maldosa ou desprezivelmente).
Tiago também infere que a culpa pelos nossos pecados e pela destruição que ele nos causa não podem ser atribuídos às pessoas, aos acontecimentos ou às circunstâncias.
Tg 1.14-15 | 14 Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido. 15 Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte.
Geralmente, quando sofremos consequências por alguma atitude, ou somos dominados por um desejo descontrolado de agir de determinada maneira, contrariando a lógica, a moral ou o senso comum, nós colocamos a culpa fora de nós. Dizemos…
– A culpa é de Deus. “Ele me fez assim. Ele permitiu tudo isso.”
– A culpa é do contexto social ou das circunstâncias desfavoráveis.
– A culpa é do outro. Ele me provocou. Ele me abusou. Ele me trapaceou. Ele me agrediu.
– A culpa é do estado em que me encontro. Fragilizado. Doente. Mentalmente incapaz.
Quem é que nunca se desculpou no outro, em Deus ou nas circunstâncias? Tiago, porém, nos ensina uma lição preciosa. A fonte da tentação, o que nos leva a pecar ou desejar pecar, o que nos faz cometer os piores tipos de maldade, os desvios de conduta, etc. é a má inclinação do nosso coração.
Sim, é verdade que Deus nos prova, Deus permite e até envia sofrimentos, mas ele nunca nos tenta. Ele nunca planeja um esquema com a intenção de nos fazer cair. Testes vêm de Deus, mas tentações vêm do coração. Adiante na carta, Tiago diz algo surpreendente, em plena harmonia com esses versos que estamos estudando. Ele fala assim:
Tg 4.1-3 | 1 De onde vêm as guerras e contendas que há entre vocês? Não vêm das paixões que guerreiam dentro de vocês? 2 Vocês cobiçam coisas, e não as têm; matam e invejam, mas não conseguem obter o que desejam. Vocês vivem a lutar e a fazer guerras. Não têm, porque não pedem. 3 Quando pedem, não recebem, pois pedem por motivos errados, para gastar em seus prazeres.
A fonte da tentação não é Deus. Como Tiago diz (1.13), Deus não é tentado pelo mal (a maldade não faz parte do seu caráter) e nem nos tenta a praticar o mal (pois do seu bom caráter só brota dádiva e perfeição – Tg 1.17).
Então, por que Deus nos prova ou permite tanto sofrimento? Tiago já nos deu algumas razões (cf. Tg 1.2-4, 12). No entanto, faremos bem em ponderar sobre as sábias palavra de Timothy Keller, quando disse assim:
Embora não forneça o motivo para cada experiência dolorosa, o cristianismo fornece recursos profundos para enfrentar o sofrimento com esperança e coragem em lugar de amargura e desespero.
Há sempre um propósito para cada sofrimento. Só o cristianismo vintage apresentado por Tiago e os demais apóstolos no Novo Testamento é capaz de nos fazer seguir a vida com fé, esperança e amor, sem culpar a Deus, o próximo ou as circunstâncias.
Ouça por exemplo o testemunho de dois grandes cristãos do passado, ao falarem do sofrimento.
George MacDonald | Não sabemos quantos prazeres da vida devemos às tristezas que a permeiam. A alegria [sozinha] não é capaz de revelar as verdades mais profundas, embora a verdade mais profunda deva ser a mais profunda alegria.
Diante do mal e do sofrimento, não resolverá se acusarmos a Deus (ou quem quer que seja); muito menos se buscarmos sentido para a vida negando a existência de Deus. A derrota definitiva para o mal e para o sofrimento começa no reconhecimento de que a fonte da tentação para o mal está na inclinação pecaminosa do nosso coração. A partir daí buscaremos as medidas corretas. Enquanto isso, buscamos viver da esperança que só o cristianismo bíblico pode nos dar. Ouça o que, inspirado pela interpretação do Novo Testamento feita por C. S. Lewis, Timothy Keller afirmou:
[O Céu] é a derrota definitiva do mal e do sofrimento. Eles não só terão fim, como também serão vencidos de forma tão radical que o que aconteceu servirá apenas para tornar nossa vida e felicidade futuras infinitamente maiores.
Todo soldado vitorioso, todo atleta campeão, todo profissional bem-sucedido dirá que a conquista começa pela compreensão dos mecanismos. É mais ou menos assim. No caso do soldado, por exemplo: Quem é o inimigo? Como ele pensa? Como ele age? No caso do atleta: Qual é a prova? Quais são os adversários? Como funciona o corpo humano? E assim por diante.
Toda ação depende da compreensão de certos mecanismos. Não é diferente no caso da tentação. Se quisermos vencer a tentação (aquelas inclinações maldosas, imorais e irresponsáveis do coração), além de reconhecer que a fonte está no coração, nós precisamos compreender o seu mecanismo. Isto é, precisamos saber como ela tem início, como ela avança e o que ela de fato produz. Tiago nos dá, em câmera lenta, uma imagem perfeita do mecanismo da tentação. Observe…
Tg 1.13-16 | 13 Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: “Estou sendo tentado por Deus”. Pois Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. 14 Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido. 15 Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte. 16 Meus amados irmãos, não se deixem enganar.
Nós podemos assistir aqui ao progresso da tentação em cinco estágios: ilusão, atração, preocupação, concepção e, por fim, destruição.
2.1 – Tentação começa com uma ilusão (enganação)
Tg 1.16 | Meus amados irmãos, não se deixem enganar.
Tiago encerra a descrição do mecanismo da tentação com o substantivo que revela o que deu início a todo o processo: “engano” ou “ilusão”.
Deixar-se enganar pelo ou iludir-se com o pecado significa desprezar o que a Palavra de Deus diz e agir com a seguinte consciência: “Eu sei o que é melhor para mim. Não preciso de Deus.”
O pecado nos engana e nos ilude ao redefinir o que Deus definiu, ao desprezar o que Deus disse, ao relativizar a verdade de Deus. Dessa forma, a ilusão ou o engano do pecado nos leva a dizer mais ou menos assim: “Sim, eu sei o que Deus diz, mas é tão agradável ao paladar, tão atraente aos olhos e, além disso, tão desejável para disso se obter discernimento, que eu quero provar!” (cf. Gn 3.2-6).
A tentação começa com uma ilusão: a de achar que se sabe o que é melhor para si, desprezando ou reinterpretando a Palavra de Deus.
2.2 – Tentação vem na forma de atração
Tg 1.14 | Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado…
Ao se iludir com a mentira de que é possível viver sem a orientação da Palavra de Deus, sem os parâmetros da revelação divina, fica-se vulnerável ao maus desejos, podendo ser arrastado (gr. fisgado) por qualquer atração.
Você já notou que, geralmente, alguém “atraído” ou “fisgado” não vive por uma verdade, mas de sentimentos – o sentimento de atração? Tentação, vem na forma de atração.
2.3 – Tentação causa preocupação
Tg 1.14 | Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido.
Enganado e atraído, o coração começa a viver preocupado. Ele quer saciar a todo custo o seu desejo; quer ter, quer provar, quer experimentar. É a compulsão do pecado.
2.4 – Tentação dá à luz o pecado
Tg 1.15 | Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado,…
A compulsão do pecado nos faz agir. Quando o “espermatozoide” do “mau desejo” se encontra com o “óvulo” da tentação ocorre a concepção e, posteriormente, o nascimento do pecado. Pecado algum acontece sem esse processo de “concepção” e de “gestação”. Alguns, porém, levam mais tempo que outros. A maioria acontece em instantes.
2.5 – Tentação causa destruição
Tg 1.15 | (…) e o pecado, após ter se consumado, gera a morte.
O fruto do pecado não pode ser outro senão a morte, a destruição. A coisa é tão séria que Tiago adverte no final:
Tg 1.16 | Meus amados irmãos, não se deixem enganar.
Não se iludam com o pecado. Compreendam o mecanismo da tentação.
De que adianta saber qual é a fonte, de que vale compreender o mecanismo da tentação se não soubermos como resisti-la? Portanto, encerraremos aprendendo com Tiago que o cristão aprovado resiste ao progresso da tentação. Mas, como?
3.1 – Não se deixe enganar
Tg 1.16 | Meus amados irmãos, não se deixem enganar.
Não abandone os parâmetros da Palavra de Deus. Como? Ouça o autor de Hebreus.
Hb 3.12-13 | 12 Cuidado, irmãos, para que nenhum de vocês tenha coração perverso e incrédulo, que se afaste do Deus vivo. 13 Ao contrário, encorajem-se uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama “hoje”, de modo que nenhum de vocês seja endurecido pelo engano do pecado,
Nós precisamos da Palavra de Deus (para nos exortar) e da comunhão da igreja (para nos encorajar). Não se deixar enganar é saber aproveitar da Palavra de Deus na comunhão da igreja local (cultos e Casas Acolhedoras).
3.2 – Não duvide do amor de Deus
Tg 1.17 | Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, que não muda como sombras inconstantes.
Não duvide do amor de Deus. Tenha fé em sua Palavra e confie nas suas promessas. Quando nós duvidamos da “boa dádiva” e de “todo dom perfeito” de Deus, quando nós desconfiamos de Deus, ou o acusamos, ou o abandonamos, nós ficamos vulneráveis ao pecado.
Não duvide do amor de Deus. Seja crente.
3.3 – Não aja como um descrente
Tg 1.18 | Por sua decisão ele nos gerou pela palavra da verdade, a fim de sermos como que os primeiros frutos de tudo o que ele criou.
Tiago está dizendo que fomos soberana e graciosamente salvos. Portanto, não nos convém viver como se não houvesse em nós a palavra da verdade que não nos deixa enganar nem ser atraídos.
O cristão aprovado resiste ao progresso da tentação. Ele não se deixa enganar, não duvida do amor de Deus nem age como um descrente. Ele tem plantado em si a “palavra da verdade”.
O cristão aprovado
Seja você também um cristão aprovado. Resista à tentação.
Receba hoje mesmo em seu coração a Palavra de Deus, o Verbo eterno do Pai, Jesus Cristo, o Senhor e Salvador de todo aquele que crê.
As provações existem e muitas vezes são a nós enviadas por Deus. É parte de seu plano sábio e amoroso para todos nós crescermos. Tentações, no entanto, não vêm de Deus. Tentações concebidas dão à luz o pecado.
Receba a Jesus e viva pela fé na graça de Deus. Resista à tentação.
S.D.G. L.B.Peixoto
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