08.08.2018
POR QUE CRENTE É TÃO CHATO?
Colossenses 1.1
Eu, Paulo, […] escrevo esta carta, junto com nosso irmão Timóteo,
Por que crente é tão chato?
Essa pergunta não sai da cabeça de quem convive com certos crentes todos os dias. Também, não poderia ser diferente, pois muitos crentes são reconhecidos por levarem excessivamente a sério toda e qualquer opinião, são radicais e intransigentes, têm respostas prontas para tudo, metralham versículos em todo mundo, nunca têm dúvida de nada, parece que não sentem compaixão, estão sempre prontos para condenar o comportamento das pessoas, sentem prazer em mandar as pessoas para o inferno, não conseguem ser leves, não sorriem, vivem acusando, são de poucos amigos… e por ai vai…
Por que crente é tão chato? Você já se fez esta pergunta?
Jesus era gente boa
Será que Jesus era chato? De jeito nenhum! Jesus não era um chato. O Senhor estava longe de ser chato. Sim, ele era chato com os chatos. Mas quem eram os chatos? Os chatos eram os fariseus, aqueles religiosos orgulhosos do tipo: “façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço”. Jesus era chato com os hipócritas que o perseguiam e o acusavam e tramavam contra a vida dele. Com essa gente, o Senhor, realmente, não tinha paciência. Agora, com as pessoas comuns, com os pecadores quebrados pela vida, ele era cheio de graça e de verdade. Quer ver uma coisa?
Se Jesus fosse realmente chato, ele não seria convidado para festas, casamentos e banquetes, por exemplo. O que nos faz pensar que ele era uma pessoa agradável para se relacionar. Não é mesmo? Afinal, quem convidaria um chato para suas festas? Você convidaria? De fato, era tão comum as amizades diferentes e a presença frequente de Jesus nas festas, que seus perseguidores o acusaram de “comilão e beberrão”.
A bem da verdade, Jesus não era de jeito nenhum dado a excessos de qualquer natureza, ele estava longe de ser bêbado e comilão de festas, mas ele admite que, sendo gente boa como ele realmente era, frequentava sim festas e banquetes para os quais era convidado, não se importando (e também não se afetando) com o caráter duvidoso das suas companhias. Ouça o argumento do Senhor (Lc 7.33-35):
33Quando João Batista apareceu, não costumava comer e beber em público, e vocês disseram: ‘Está possuído por demônio’. 34O Filho do Homem, por sua vez, come e bebe, e vocês dizem: ‘É comilão e beberrão, amigo de cobradores de impostos e pecadores’. 35Mas a sabedoria é comprovada pela vida daqueles que a seguem.”
Percebeu? Jesus não era um chato. Era gente boa, tão gente boa que os pais traziam seus filhos para perto dele, esperando que fossem abençoados. E Jesus não só os acolhia com carinho, de uma forma que não os espantava, como também era sensível o bastante para ver traços de qualidade invejáveis nesses pequeninos. Acompanhe (Mc 10.13-16):
13Certo dia, trouxeram crianças para que Jesus pusesse as mãos sobre elas, mas os discípulos repreendiam aqueles que as traziam. 14Ao ver isso, Jesus ficou indignado com os discípulos e disse: “Deixem que as crianças venham a mim. Não as impeçam, pois o reino de Deus pertence aos que são como elas. 15Eu lhes digo a verdade: quem não receber o reino de Deus como uma criança de modo algum entrará nele”. 16Então tomou as crianças nos braços, pôs as mãos sobre a cabeça delas e as abençoou.
Crente não precisa e não pode ser chato. Crente, assim como Jesus, tem que ser gente boa. Ser gente boa é fruto da graça; é expressão de graça; é prova de que se recebeu graça. Quem, de fato, recebeu graça de Deus (favor imerecido do Pai) em Jesus Cristo, reparte graça (na forma de amor, bondade, paciência e tolerância — cf. Rm 2.4) a todos quantos cruzam seu caminho. Crente é gente boa. Tem que ser gente boa. Crente não pode ser chato.
Paulo também era gente boa
Outro que não era chato era Paulo. Paulo era amigo. Paulo era irmão. Ouça mais uma vez suas palavras introdutórias na carta aos cristãos de Colossos (Cl 1.1):
Eu, Paulo, […] escrevo esta carta, junto com nosso irmão Timóteo,
A carta, na verdade, estava sendo escrita por Paulo. Timóteo era apenas o seu amanuense ou secretário. As ideias saiam da cabeça de Paulo, passavam pelos seus lábios na forma de sons inteligíveis e compreensíveis e Timóteo cumpria seu humilde papel de escrevente, tomando nota de tudo com muita atenção, capricho e dedicação — “Espere um pouco. Repita, por favor. E-u, Pau-lo, es-cre-vo es-ta car-ta jun-to com nos-so ir-mão Ti-mó-teo… Mais devagar, Paulo. Pera aí!”. Timóteo, portanto, não passava de um coadjuvante, de um escrivão obediente. Paulo, no entanto, faz questão de registrar: “Eu, Paulo, […] escrevo esta carta, junto com nosso irmão Timóteo,”.
Por quê? O que nós podemos aprender com Paulo sobre o crente e os seus relacionamentos humanos? Permitam-me quatro lições: 1 – não estamos no mundo para condenar, mas para resgatar; 2 – amizade não nasce pronta, constrói-se; 3 – sozinho ninguém consegue transformar o mundo; 4 – o segredo das pessoas gente boa.
1. Não estamos no mundo para condenar, mas para resgatar
A forma como enxergamos a nossa missão no mundo ditará o jeito como nos relacionaremos com as pessoas. Se a gente acha, enquanto crentes, que o nosso papel é condenar, não passaremos de advogados de condenação implacáveis. Jesus, no entanto, nos revela a que ele veio ao mundo, sendo essa, portanto, a nossa missão também:
Jo 3.17| Deus enviou seu Filho ao mundo não para condenar o mundo [o mundo já está condenado, Jo 3.18 e 36!], mas para salvá-lo por meio dele.
Mc 10.43-45 |43Entre vocês, porém, será diferente [vocês não exercerão poder sobre as pessoas, v. 42]. Quem quiser ser o líder entre vocês, que seja servo, 44e quem quiser ser o primeiro entre vocês, que se torne escravo de todos. 45Pois nem mesmo o Filho do Homem veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos.
Paulo compreendeu essa missão, pois de perseguidor (Fl 3.6 e 1Tm 1.13) ele passou a ser perseguido (Gl 5.11 e 6.17). Esse apóstolo, literalmente, deu a sua vida (2Tm 4.6-8) em resgate pelos gentios (gente que não era judeu). A sua relação com as pessoas foi transformada de dono da verdade (fariseu de fariseu) para servo da graça de Deus e por isso a sua convivência com as pessoas se tornou amorosa, recheada com a intensão misericordiosa e compassiva de resgatar as pessoas pelo poder do evangelho.
Gente assim não mata (nem com palavras) para conseguir manter a verdade sobre as verdades dos outros; gente assim sabe que as pessoas já estão condenadas pela verdade que elas tanto combatem com escárnio; gente assim como Paulo, que foi transformada pelo poder do evangelho, é cheia de graça e de verdade e sabe que não está no mundo para condenar, mas para resgatar. Foi exatamente isto o que Paulo fez com Timóteo.
Timóteo era natural de Listra. Filho de mãe judia e de pai grego. Na primeira viagem missionária de Paulo, passando por Listra, o apóstolo ganhou Timóteo, sua mãe e sua avó para Jesus (At 14.8-23 e 2Tm 1.5). Na segunda vez que Paulo passou por lá, ouvindo que os cristãos davam tão bom testemunho sobre a nova criatura que Timóteo estava se tornando em Cristo, o apóstolo decidiu levar consigo o filho na fé (At 16.1-3).
Não estamos no mundo para condenar, mas para resgatar.
2. Amizade não nasce pronta, contrói-se
Às vezes desistimos das pessoas ou nem ao menos acreditamos nelas sem sequer tentar. Deixamo-nos guiar pelas aparências e tomamos partido pelas impressões baseadas em gostos pessoais ou situações aparentemente irrecuperáveis. Não é assim? Agora, imagine se Deus decidisse simplesmente desistir de nós por causa do que ele vê na gente. Estaríamos todos perdidos. Deus escolheu nos amar e fazer de nós amigos (Jo 15.15).
Apesar de quem era e do que já tinha feito, Paulo foi alvo da graça imerecida de Deus. Foi salvo e transformado por Jesus. E dessa forma ele passou a olhar para as pessoas e vê-las com potencial de transformação e também transformador, desde que estivessem sob as garras da graça (afinal, essa era a história da vida dele). Então, passando por Listra, pregou o evangelho a Timóteo. O garoto se converteu. Mais tarde, quando os dois se reencontraram e Paulo ouviu falar tão bem do crescimento dele, decidiu investir um pouco mais e torná-lo um grande vaso de bençãos para as pessoas.
Paulo e Timóteo se tornaram grandes amigos. De todos os que caminharam lado a lado com ele (e foram muitos!), Timóteo foi o que recebeu as maiores honras do apóstolo (1Ts 3.2; 1Co 4.17; Fl 2.19-24). Essa amizade, porém, não nasceu pronta. Foi construída ao longo de anos, entre os altos e baixos de qualquer relacionamento. Dessa forma, Timóteo, de “verdadeiro filho na fé”(1Tm 1.2) e de “filho amado”(2Tm 1.2), tornou-se “irmão”(Cl 1.1), “ministro”ou “servo”(2Co 1.1 em relação a 3.6 e 6.4),“colaborador” ou “cooperador” (Rm 16.21), alguém que trabalhava na obra do Senhor com Paulo (1Co 16.10) e “bom soldado de Cristo” (2Tm 2.3). De filho a amigo. De discípulo a colaborador.
Paulo prezava muito pela construção de amizades, mesmo com aqueles que ele pudesse ter tido desavença e racha. Por exemplo, houve uma ocasião quando Paulo e Barnabé se apartaram por causa de João Marcos. Está lá em Atos 15.36-41:
36Algum tempo depois, Paulo disse a Barnabé: “Voltemos para visitar cada uma das cidades onde pregamos a palavra do Senhor, para ver como os irmãos estão indo”. 37Barnabé queria levar João Marcos, 38mas Paulo se opôs, pois João Marcos tinha se separado deles na Panfília, não prosseguindo com eles no trabalho. 39O desentendimento entre eles foi tão grave que os dois se separaram. Barnabé levou João Marcos e navegou para Chipre. 40Paulo escolheu Silas e partiu, e os irmãos o entregaram ao cuidado gracioso do Senhor. 41Então ele viajou por toda a Síria e Cilícia, fortalecendo as igrejas de lá.
Teria sido muito trágico se não tivesse ocorrido reconciliação e recomeço que proporcionou enorme crescimento, tanto pessoal como no avanço do reino de Deus. Por exemplo, adiante na carta aos Colossenses, Paulo anotou (Cl 4.10):
Aristarco, que é prisioneiro comigo, lhes envia saudações, e assim também Marcos, primo de Barnabé. Conforme vocês foram instruídos, se Marcos passar por aí, recebam-no bem.
Em Filemom 24, Paulo chama João Marcos de “colaborador”. Depois, perto do fim de sua vida, Paulo, esse mesmo que se opôs à chance dada por Barnabé a João Marcos, escreveu assim a Timóteo (2Tm 4.11): “Apenas Lucas está comigo. Traga Marcos com você, pois ele me será útil no ministério”.
Paulo aprendeu que amizade não nasce pronta, constrói-se com graça, investimento, perdão e recomeços. Crente não pode simplesmente riscar alguém da sua vida. Já pensou se Deus tivesse feito assim conosco? Já pensou se Paulo não tivesse investido em Timóteo? Já pensou se Paulo não tivesse se reconciliado com Barnabé e João Marcos? Amizade não nasce pronta, constrói-se.
3. Sozinho ninguém chega a lugar nenhum
Paulo, aos Colossenses, escreveu assim: “Eu, Paulo, […] escrevo esta carta, junto com nosso irmão Timóteo,”. Pergunta: se Paulo é que era o autor de fatodesta carta e Timóteo não passava de seu amanuense (escrevente), por que citar Timóteo aqui desta maneira?
Primeiro, para mostrar aos Colossenses que ele não estava sozinho naquele encarceramento. O exemplo de Timóteo deveria dizer que não apenas Paulo, mas outros irmãos também estavam dando sua vida pelo evangelho da glória e da graça de Deus. Paulo estava encorajandoos irmãos com o exemplo de Timóteo.
Segundo, Paulo estava atestando que tudo o que ele escrevia não eram coisas só da sua cabeça. Havia uma comunidade de Cristãos, dentre eles Timóteo, que compartilhava daquelas verdades. Paulo estava autenticandoo seu ensino com o testemunho de Timóteo.
Terceiro, Paulo estava endossado Timóteo como um pregador do evangelho. Sendo Timóteo “coautor” com Paulo, aquele moço, apesar de jovem, era digno de ser ouvido como testemunha respeitável de Cristo. Paulo estava endossandoo ministério de Timóteo.
Por que Paulo age assim dessa maneira?
Paulo tinha consciência de que sozinho ninguém chega a lugar nenhum, ninguém consegue transformar o mundo sozinho, especialmente com o evangelho de Jesus Cristo. Precisamos do irmão para nos encorajar, nos fortalecer, nos edificar, interceder por nós e batalhar lado a lado conosco. Além disso, o mundo, para ser transformado com o evangelho, precisa de todos os tipos diferentes de dons e talentos distribuídos por Deus a cada um de seus filhos e filhas. Ninguém possui todos os dons e habilidades. Ninguém conseguirá romper em fé se estiver sozinho.
Paulo, além de ter sido grandemente animado por irmãos de fé ao longo de sua caminhada (1Tm 1.16), tendo investido sua vida em tantas outras pessoas, caminhando lado a lado com elas, ensinando o evangelho com doutrina e exemplo de vida, quando partiu para estar com Cristo deixou um exército de soldados de Cristo, pronto para avançar com o evangelho que, graças a Deus e a esta visão, chegou até nós em Goiânia.
Sozinho ninguém chega a lugar nenhum, sozinho ninguém consegue transformar o mundo. Paulo que nos diga! Daí eu te pergunto, com quem você reparte os seus fardos; quem encoraja você quando você mais precisa; em quem você tem investido sua vida com o evangelho de Jesus Cristo? Sozinho ninguém chega a lugar nenhum. Sozinho ninguém consegue transformar o mundo. Sozinho, você morrerá pelo caminho, não chegará a lugar nenhum e não terá a quem repassar o bastão.
4. O segredo das pessoas gente boa
Como Paulo era capaz de perdoar ou de se arrepender e recomeçar com as pessoas (assim como foi com João Marcos e Barnabé)? Como ele conseguia olhar para um jovem como Timóteo, por exemplo, sendo Paulo quem era, academicamente falando, e vê-lo como um igual, sendo capaz de dizer: “Eu, Paulo, […] escrevo esta carta, junto com nosso irmão Timóteo,”(Cl 1.1)? O segredo desse sujeito gente boa está na saudação de outra carta, a carta aos Filipenses, onde se lê (Fl 1.1):
Paulo e Timóteo, escravos de Cristo Jesus, escrevemos a todo o povo santo em Cristo Jesus que está em Filipos, […]
O segredo de Paulo pode ser encontrado na forma como ele descreve a Timóteo e si mesmo: “servos”, “escravos” (gr. doulos). Percebe-se aqui a maturidade espiritual de Paulo e Timóteo (e obviamente dos demais companheiros); também se enxerga o ingrediente que possibilitou tão bela comunhão entre Paulo e seus discípulos-amigos. Os escravos pertencem ao mesmo senhor e, portanto, relacionam-se de igual para igual. Ninguém é melhor que ninguém. Eles vivem para cuidar dos afazeres de seu senhor e, para tanto, ajudam-se mutuamente.
O segredo das pessoas gente boa está nelas se verem como elas realmente são: servas de um mesmo Senhor, o Deus e pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Paulo tanto tinha consciência dessas coisas que escreveu, exortando os Romanos (Rm 12.3):
Com base na graça que recebi, dou a cada um de vocês a seguinte advertência: não se considerem melhores do que realmente são. Antes, sejam honestos em sua autoavaliação, medindo-se de acordo com a fé que Deus nos deu.
O segredo das pessoas gente boa é se enxergar em Cristo, verem-se crucificadas em Cristo, vivendo não mais elas, mas Cristo nelas; vivendo pela fé em Cristo a vida que agora elas vivem no corpo (Gl 2.20). Quem para de se medir por si mesmo, quem tira os olhos de si e coloca os olhos em Cristo, consegue amar o outro, viver pelo outro, entregar-se em resgate pelo outro. Gente assim é gente boa. Crente assim é sal e luz.
Por que crente é tão chato?
Por que crente é tão chato?
Crente é chato quando ele não aprende que nós não estamos no mundo para condenar, mas para resgatar; não descobre que amizade não nasce pronta, constrói-se; não percebeque sozinho ninguém chega a lugar nenhum, sozinho ninguém consegue transformar o mundo; não enxergaque o segredo das pessoas gente boa é tirar os olhos de si mesmo e colocá-los em Jesus Cristo.
Não seja chato. Seja crente. Crente como Jesus. Crente como Paulo.
Como?
Admita e confesse a sua incapacidade, o seu pecado.
Receba Jesus pela fé em seu coração.
Busque em Jesus graça e força para conseguir.
Meça-se de acordo com a graça e a fé recebidas do Senhor.
Encontre um Timóteo e invista sua vida nele.
S.D.G. L.B.Peixoto
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