07.09.2016
A PRESCIÊNCIA DE DEUS
Salmo 14
1 Diz o tolo em seu coração: “Deus não existe”. Corromperam-se e cometeram atos detestáveis; não há ninguém que faça o bem. 2 O Senhor olha dos céus para os filhos dos homens, para ver se há alguém que tenha entendimento, alguém que busque a Deus. 3 Todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer. 4 Será que nenhum dos malfeitores aprende? Eles devoram o meu povo como quem come pão, e não clamam pelo Senhor! 5 Olhem! Estão tomados de pavor! Pois Deus está presente no meio dos justos. 6 Vocês, malfeitores, frustram os planos dos pobres, mas o refúgio deles é o Senhor. 7 Ah, se de Sião viesse a salvação para Israel! Quando o Senhor restaurar o seu povo, Jacó exultará! Israel se regozijará!
O problema do homem
Em 1908 o The Times, célebre e histórico jornal inglês (publicado diariamente desde 1785), perguntou a um grupo seleto de autores renomados sobre o tópico: “Qual é o problema do mundo?” A resposta de G. K. Chesterton foi a mais curta e a mais eloquente. O pensador britânico simplesmente escreveu:
Caros Senhores,
Sou eu.
Atenciosamente,
G. K. Chesterton
Obviamente que Chesterton não estava insinuando que ele próprio houvesse cometido todos os crimes do mundo. O ponto era que o problema do mundo reside no fato de todos os seres humanos serem pecadores. Não há porque apontar o dedo para qualquer pessoa ou problema. Se eu sou pecador, o problema sou eu e a transformação do mundo passa, necessariamente, pela minha transformação.
O Salmo 14 é um texto-chave das Escrituras: nele o salmista revela que a humanidade está arruinada pelo pecado. Toda a espécie humana – todos e cada um de nós – se rebelou contra Deus. Ao mesmo tempo que somos coroados “de glória e de honra” (Sl 8.5) – por carregamos a imagem do Criador em nós -, trazemos também a vergonha do pecado em nossas entranhas. Sim, somos todos, ao mesmo tempo, gloriosos e depravados. Portanto, assim como Chesterton, precisamos ter a honestidade e a coragem para dizer: “Eu sou o problema do mundo.”
A maioria das pessoas despesa esse diagnóstico. Elas são como alguns daqueles pacientes, por exemplo, que ao ouvirem aquilo que não gostariam de ouvir sobre o seu estado de saúde, procuram outro médico, saem à caça de segunda, terceira e até quarta opiniões, até conseguirem ouvir o que tanto desejam: “Você está bem, não se preocupe!” A Bíblia, porém, repete duas outras vezes o que está dito no Salmo 14 (cf. Sl 53 e Rm 3.10-12).
O Salmo 53 cita o 14 em sua totalidade, fazendo apenas algumas pequenas modificações. Em Romanos 3.10-12, Paulo cita o Salmo 14 para demonstrar que todos, tanto judeus como gentios, estão sob a condenação do pecado.
Gente, quando Deus fala uma vez, precisamos todos ouvir com atenção. Quando ele repete a mesma coisa pela segunda vez, fazemos bem ao lembrar daquilo com frequência. Quando ele repete três vezes a mesma coisa, devemos guardar no coração, ponderar e jamais nos esquecer. Como está dito, o problema do homem é o pecado.
A cura para o problema do homem
O Salmo 14 encerra a primeira seção de Salmos correlatos do Saltério, que vai do Salmo 3 ao 14. Neste bloco, é de se notar que do Salmo 3 ao 13 Davi e o seu povo estão cercados de perigos a atolados em sofrimentos. Vez após outra o salmista clama a Deus por socorro. Nesse contexto, portanto, o Salmo 14 revela que todos aqueles problemas nada mais são do que o fruto amargo do pecado que infestou a humanidade. Matthew Henry assim argumenta:
Em todos os salmos, do 3º até este (exceto o 8o), Davi vinha queixando-se daqueles que o odiavam e o perseguiam, insultavam-no e dele abusavam; agora, aqui, ele traça todas essas correntes amargas até a fonte, a corrupção geral da natureza humana, e vê que, não apenas os seus inimigos, mas todos os filhos dos homens, foram, assim, corrompidos pelo pecado.
Conflitos não se resolvem sem que, primeiramente, o problema do pecado seja resolvido. A cura definitiva para os nossos problemas, sejam eles existenciais ou relacionais, passa necessariamente pelo reconhecimento do pecado e o pedido de perdão a Deus e ao próximo. Note, mais uma vez, como o Salmo começa e como ele termina.
Sl 14.1,7 | 1 Diz o tolo em seu coração: “Deus não existe”. Corromperam-se e cometeram atos detestáveis; não há ninguém que faça o bem. […] 7 Ah, se de Sião viesse a salvação para Israel! Quando o Senhor restaurar o seu povo, Jacó exultará! Israel se regozijará!
Jamais iremos ansiar por um Salvador e por transformação, da forma como fez Davi, até que tenhamos enxergado o nosso pecado do jeito que o salmista encarou.
A presciência de Deus
Caminharemos pelo Salmo 14 com os olhos de Deus. Afinal, são os dele que realmente importam. Não importa como nós nos vemos nem como os outros nos enxergam, principalmente se tais imagens não batem com a de Deus. Importa como Deus nos vê.
O que a presciência de Deus revela sobre o homem?
1. Deus olha o coração das pessoas
Veja como Davi define o problema do homem:
Sl 14.1 | Diz o tolo em seu coração: “Deus não existe”. Corromperam-se e cometeram atos detestáveis; não há ninguém que faça o bem.
O problema essencial do homem não é o seu comportamento, mas o seu caráter. O coração corrompido é que leva o homem a cometer atos detestáveis.
Outra observação importante: o ateísmo (tanto teórico como prático) não é um problema da cabeça, mas do coração. A questão não é de intelectualidade, mas de incredulidade. É fruto de uma escolha. O homem optou por negar a existência de Deus.
O nosso texto diz: “Deus não existe” (NVI) ou “Não há Deus” (ARA), porém, é preciso ressaltar que no hebraico não constam os verbos existir ou haver. O texto original simplesmente lê: “Diz o tolo em seu coração: Não Deus”; ou seja: “Para mim, Deus não”. É uma escolha obstinada, um pressuposto falso, uma tolice.
Por que tolo? Por que não apenas incrédulo ou equivocado? Por que aqueles que negam a existência de Deus ou agem como se Deus não existisse são chamados de tolos?
Ele é tolo porque sabe que existe um Deus e mesmo assim escolhe negá-lo e viver como se Deus não existisse. James Montgomery Boice coloca tal questão da seguinte forma:
Se uma pessoa soubesse que Deus não existe e assim afirmasse, ela seria sábia e até corajosa por se levantar contra a opinião quase universal, porém equivocada, da raça humana. Se ela não soubesse que há um Deus e assim afirmasse, ela poderia ser classificada como um cético honesto ou um agnóstico. Se uma pessoa estivesse convencida de que Deus não existe quando, na verdade, ele existe, ela estaria simplesmente equivocada. Mas não é o caso de qualquer um desses, segundo o apóstolo Paulo em Romanos 1.18-23. A razão porque a pessoa é tola – e não sábia, corajosa, cética ou apenas equivocada – é que ela sabe que Deus existe e ainda assim escolhe crer e agir como se ele não existisse.
Veja o que Paulo disse, escrevendo aos Romanos:
Rm 1.18-23 | 18 Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça, 19 pois o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. 20 Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis; 21 porque, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças, mas os seus pensamentos tornaram-se fúteis e o coração insensato deles obscureceu-se. 22 Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos 23 e trocaram a glória do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros, quadrúpedes e répteis.
Resumindo:
É provável que Davi não estivesse lidando com o tipo de ateísmo que conhecemos hoje; ou seja: o ateísmo teórico – aquele do tipo defendido, por exemplo, por Susan Jacoby que, após o massacre na escola Sandy Hook, em Newtown, Connecticut, que em dezembro de 2012 matou 26 pessoas (20 crianças com idades entre 6 e 7 anos e seis adultos), escreveu um artigo para o New York Times intitulado “A benção do ateísmo”, questionando a existência de um Deus justo diante de casos como aquele.
Parece que Davi estava lidando com o ateísmo prático – aquele do tipo que reconhece a existência de Deus, mas vive como se ele não existisse; admite a existência de Deus, mas o troca por ídolos que eles possam manipular. Afinal, esta era a prática tanto de Israel como das nações ao redor. Jó, por exemplo, falou desse tipo de gente assim:
Jó 21.13-16 | 13 Os ímpios passam a vida na prosperidade e descem à sepultura em paz. 14 Contudo, dizem eles a Deus: ‘Deixa-nos! Não queremos conhecer os teus caminhos. 15 Quem é o Todo-poderoso, para que o sirvamos? Que vantagem temos em orar a Deus?’ 16 Mas não depende deles a prosperidade que desfrutam; por isso fico longe do conselho dos ímpios.
Esse tipo de ateísmo descreve bem o homem e a mulher do século XXI, que costumam dizer para si mesmos:
“Quem precisa de Deus? Eu toco os meus negócios sem a ajuda dele. Pago sozinho as minhas contas. Sigo com a vida do meu jeito. Dou conta de mim. Peço apenas que ele não me atrapalhe.”
Quando lemos o primeiro verso do Salmo 14, geralmente costumamos pensar nos ateus teóricos dos nossos dias, gente como Christopher Hitchens, Richard Dawkins e Susan Jacoby. Davi, no entanto, está descrevendo todo e qualquer ser humano sem Cristo.
Deus olha o coração das pessoas. Sem Cristo, nós procuramos os nossos próprios caminhos sem Deus. A menos que o Senhor nos faça cair em si, arrastando-nos com graça, escolheremos viver sem Deus neste mundo. Jesus colocou assim:
Jo 6.60-65 | 60 Ao ouvirem isso, muitos dos seus discípulos disseram: “Dura é essa palavra. Quem pode suportá-la?” 61 Sabendo em seu íntimo que os seus discípulos estavam se queixando do que ouviram, Jesus lhes disse: “Isso os escandaliza? 62 Que acontecerá se vocês virem o Filho do homem subir para onde estava antes? 63 O Espírito dá vida; a carne não produz nada que se aproveite. As palavras que eu lhes disse são espírito e vida. 64 Contudo, há alguns de vocês que não crêem”. Pois Jesus sabia desde o princípio quais deles não criam e quem o iria trair. 65 E prosseguiu: “É por isso que eu lhes disse que ninguém pode vir a mim, a não ser que isto lhe seja dado pelo Pai”.
Deus olha o coração das pessoas. Ele sabe como somos e que sem a graça nós sempre escolheremos viver sem Deus no mundo.
2. Deus observa a conduta do pecador
Quando se nega a existência de Deus, abre-se a porta para todo tipo de depravação. No Salmo 14, Davi lista três dimensões da depravação humana.
2.1 – A corrupção do coração
Sl 14.1 | Diz o tolo em seu coração: “Deus não existe”. Corromperam-se […]
2.2 – A corrupção do comportamento
Sl 14.1-3 | 1 Diz o tolo em seu coração: “Deus não existe”. Corromperam-se e cometeram atos detestáveis; não há ninguém que faça o bem. 2 O Senhor olha dos céus para os filhos dos homens, para ver se há alguém que tenha entendimento, alguém que busque a Deus. 3 Todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer.
2.3 – A corrupção da comunhão
Sl 14.4 | Será que nenhum dos malfeitores aprende? Eles devoram o meu povo como quem come pão, e não clamam pelo Senhor!
Somos todos, por natureza, tardos de coração e não oramos a Deus. Usamos e até devoramos os outros para obter o que tanto desejamos para ser felizes.
Deus observa a conduta do pecador: fruto de um coração corrompido – que frutifica através de um comportamento depravado e de comunhão destruidora.
3. Deus odeia a crueldade do perverso
O perverso, ao longo da vida, comete um irreparável erro de cálculo. Ele ignora não só a existência de Deus, mas, também, o seu juízo. Davi, porém, nos mostra que aquilo do que o tolo passou a vida correndo, um dia virá com força total para julgá-lo: a justiça de Deus.
Sl 14.4-6 | 4 Será que nenhum dos malfeitores aprende? Eles devoram o meu povo como quem come pão, e não clamam pelo Senhor! 5 Olhem! Estão tomados de pavor! Pois Deus está presente no meio dos justos. 6 Vocês, malfeitores, frustram os planos dos pobres, mas o refúgio deles é o Senhor.
Deus odeia a crueldade do perverso. Eles serão julgados por não terem aprendido de Deus, não terem sido justos e não terem nutrido comunhão com o Criador. Os justos terão refugio em Deus, mas o ímpio perecerá. Deus odeia a crueldade do perverso.
4. Deus ouve o clamor do piedoso
Após descrever o coração, a conduta e a crueldade do ímpio, Davi conclui com esperança.
Sl 14.7 | Ah, se de Sião viesse a salvação para Israel! Quando o Senhor restaurar o seu povo, Jacó exultará! Israel se regozijará!
Assolado pelo pecador, o povo de Deus segue clamando pela salvação do Senhor. Afinal, só Deus pode mudar corações, transformar comportamentos e julgar a crueldade com a devida justiça.
Que salvação é essa de que todos precisamos?
“Salvação” aqui no verso 7 é tradução do hebraico “yeshua”. O nome Jesus é derivado dessa exata palavra. Jesus é a salvação; ele é a justiça de Deus; é o perdão para os nossos pecados; é o poder para nos transformar; é o caminho, a verdade e a vida.
Quando o pecador clama por salvação, o Senhor o restaura e coloca nos seus lábios um novo cântico. É disso que trata Davi na conclusão de seu Salmo.
Sl 14.7 | Ah, se de Sião viesse a salvação para Israel! Quando o Senhor restaurar o seu povo, Jacó exultará! Israel se regozijará!
A presciência de Deus
O tolo despreza a Deus no seu coração. Do céu, porém, Deus a tudo vê:
Deus olha o coração das pessoas
Deus observa a conduta do pecador
Deus odeia a crueldade do perverso
Deus ouve o clamor do piedoso
A cura para os males do mundo passa pela cura do coração do pecador, à partir do meu.
O pecador precisa reconhecer seu pecado e clamar por perdão. Assim ele será perdoado.
Os cristãos devem suplicar que o Espírito leve o pecador a Deus (Jo 6.60-65).
A presciência de Deus demonstra que é só pela graça de Jesus Cristo.
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