28.08.2016
A TRILHA DO TOMBO
Lucas 22.60-62
60 Pedro respondeu: “Homem, não sei do que você está falando!” Falava ele ainda, quando o galo cantou. 61 O Senhor voltou-se e olhou diretamente para Pedro. Então Pedro se lembrou da palavra que o Senhor lhe tinha dito: “Antes que o galo cante hoje, você me negará três vezes”. 62 Saindo dali, chorou amargamente.
A vergonha da queda
Cair é ruim demais! Machuca e envergonha a gente. Há casos em que, piorando tudo, nossos tombos até fazem vítimas. Só quem já levou um tombo clássico sabe o quanto custa.
Algumas pessoas são mais propensas a cair do que outras. Tem gente que cai da cama, da cadeira, da escada; cai andando; cai da bicicleta; etc.
Como qualquer pré-adolescente da minha geração, uma das coisas que eu mais gostava de fazer era andar de bicicleta. A minha era uma Monareta da Monark.
Uma vez, pedalando em frente ao Colégio São Domingos, que ficava ali na rua perpendicular à Igreja São Judas Tadeu, no Setor Coimbra, eu quis fazer gracinha para os alunos que estavam na porta da escola. Acelerei o pedal. Tirei as mãos do guidom e levantei os braços. Como não tinha tanta habilidade assim, perdi o controle, a bicicleta serpenteou e quando eu me dei conta já estava com a cara no chão. Com o tombo, ralei joelhos, braços, cotovelos e rosto. Não houve vítimas, com exceção do bolso de minha mãe que precisou pagar pelo conserto da bicicleta.
Além da dor e do prejuízo, o tombo foi um vexame! Levantei correndo, peguei a Monareta e dei no pé, ao som dos gritos e das vaias de deboche.
Os tipos de tombos
Os piores tipos de tombos não são os físicos. Piores são os morais ou espirituais. Aqueles tombos que nós levamos diante de Deus e dos homens.
Geralmente, após um tombo, costumamos ficar com uma enorme indagação na cabeça. Em alguns casos, a pessoa chega ao precipício do desespero, pensando sobro como tudo poderia ter sido diferente. Com a cara no chão, a gente fica se flagelando: Ah se eu tivesse dito de outra forma… Ah se eu tivesse agido de outra maneira… Ah se eu tivesse pensado de outro jeito… Ah se eu tivesse lembrado…
Os tombos morais ou espirituais costumam ser causados por dois motivos principais: erros humanos ou desobediência declarada.
Às vezes, a pessoa, bem-intencionada, age de forma errada e se esborracha. Por exemplo: li a história de um missionário que servia como mecânico de aviões. Seu currículo era de excelentes serviços prestados às aeronaves de agências missionárias americanas. Um dia, trabalhando num pequeno avião, enquanto apertava a porca de um parafuso, ele foi chamado para fazer outra coisa. Distraiu-se como a nova tarefa e se esqueceu de voltar para terminar o arrocho da porca com a chave inglesa. Resultado. O avião decolou com sete passageiros a bordo. A porca solta permitiu que gasolina vazasse no motor do avião. Eventualmente, o avião pegou fogo, caiu e matou todos os sete missionários.
No funeral, o mecânico se deparou com sete caixões alinhados no templo da igreja para a realização do culto fúnebre. A sua consciência o atormentava, ao ponto de quase destruí-lo. Tudo ficava ainda mais acentuado por causa do choro das sete viúvas e dos filhos pequeninos que tinham perdido seus pais. Ondas de arrependimento quase afogaram aquele mecânico missionário no desespero. Tudo porque, em um lapso de momento, o seu erro, além de fazê-lo cair, literalmente derrubou sete outras famílias.
Nesses casos, tudo o que se tem a fazer é pedir perdão. Foi o que aquele mecânico fez e, afortunadamente, todas as esposas concederam-lhe graça.
Além dos erros humanos, costumamos cair por causa de desobediências declaradas. Escolhemos certo estilo de vida, apesar de reconhecermos que aquela maneira de viver não é correta. Optamos por determinados caminhos, mesmo quando a consciência diz que deveríamos caminhar na direção oposta. Fazemos certas escolhas, ainda que a Bíblia diga que tais atitudes não glorificam a Deus. Enfim, apesar de confrontados com a verdade, insistimos em permanecer no erro. Nesses casos, o tombo é sempre certo.
Caráter escultural
Pedro foi um discípulo que caiu e caiu feio. Deus, no entanto, com graça e com verdade, o restaurou, levantando-o de seu tombo. A história da vida de Pedro, de Davi e de todos os outros heróis da fé ensinam que homens e mulheres com caráter escultural não são os que não pecam ou que não caem, pois é impossível. Caráter escultural é resultado de contrição do coração, confissão de pecados e conversão de caminhos. Veja o que disse o apóstolo João.
1Jo 1.7-9 | 7 Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado. 8 Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. 9 Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda injustiça. 10 Se afirmarmos que não temos cometido pecado, fazemos de Deus um mentiroso, e a sua palavra não está em nós.
O discípulo de Jesus é chamado para andar à luz da Palavra de Deus. Afinal, ela é lâmpada que ilumina os nossos passos e luz que clareia o nosso caminho (Sl 119.5). Cai menos aqueles que andam na luz da Palavra.
Porém, mesmo andando na luz, nossa natureza contaminada nos inclina para o erro e para o pecado. Nessas horas, não podemos acobertar os nossos pecados. Devemos confessá-los em busca de graça, de perdão e de restauração.
Dizer que existe discípulo perfeito é fazer de Deus um mentiroso, pois todos nós somos pecadores, inclusive os cristãos. A diferença é que o caráter do cristão está sendo moldado pelo Espírito de Deus, à luz da Palavra de Deus e com a força que vem da graça de Deus em Jesus Cristo. Como já dissemos, caráter escultural não é sinônimo de perfeição; é resultado de contrição do coração, confissão de pecados e conversão de caminhos.
A trilha do tombo
Dito isto, passemos agora ao tombo de Pedro com duplo objetivo: 1 enxergar a trilha do tombo ou o caminho que nos leva à queda; e 2 investigar qual é o caminho que nos leva de volta ao colo de Deus e que nos mantém em pé.
1. A trilha do tombo começa no orgulho
Salomão, sabiamente, afirmou que o orgulho vem antes da queda (Pv 16.18). No caso de Pedro não foi diferente.
Os discípulos, inclusive Pedro, pelo caminho com Jesus (vejam bem!) discutem entre si sobre “qual deles era considerado o maior” (Lc 22.24). Jesus os repreende, ensinando que no Reino de Deus o maior não é o que tem mais servos ou é servido, mas quem mais serve; o grande benefício do Reino de Deus não é receber o aplauso dos homens, mas comer na mesa do Rei Jesus (Lc 22.25-30).
Tendo repreendido os discípulos com a verdade, Jesus exorta a Pedro sobre a grande batalha que todo cristão está inserido.
Lc 22.31-32 | 31 “Simão, Simão, Satanás pediu vocês para peneirá-los como trigo. 32 Mas eu orei por você, para que a sua fé não desfaleça. E quando você se converter, fortaleça os seus irmãos”.
Pedro, no entanto, revela o que estava em seu coração: orgulho, vaidade, presunção; o sentimento de que ele era o maior de todos e, como tal, não precisava da ajuda de ninguém, nem da de Deus. Jesus, então, retruca e diz: “Pedro, Pedro, esse seu orgulho colocou você na trilha do tombo!”
Lc 22.33-34 | 33 Mas ele respondeu: “Estou pronto para ir contigo para a prisão e para a morte”. 34 Respondeu Jesus: “Eu lhe digo, Pedro, que antes que o galo cante hoje, três vezes você negará que me conhece”.
A trilha do tombo começa no orgulho: o orgulho de pensar que você e maior e melhor do que os outros; o orgulho de querer ser reconhecido e ser servido; o orgulho de querer ter domínio, privilégio, última palavra; o orgulho de pensar que não precisa da graça de Deus para viver, conquistar e permanecer.
O orgulho é algo tão sutil, que quem dele sofre não percebe a doença.
1Co 10.12 | Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia.
A trilha do tombo começa no orgulho; no orgulho que cega, que rouba de nós a sabedoria e que nos coloca no caminho da destruição vexaminosa.
Pv 28.26 | Quem confia em si mesmo é insensato, mas quem anda segundo a sabedoria não corre perigo. Pv 29.23 | O orgulho do homem o humilha, mas o de espírito humilde obtém honra.
A trilha do tombo começa no orgulho.
2. A trilha do tombo avança pela falta de oração
O orgulhoso não costuma orar. Ao orar, ele apenas decreta as suas vontades. Tiago chama isso de pedir mal; de pedir por motivos errados; de pedir para gastar nos próprios prazeres (Tg 4.3).
Quem não ora não vigia e, quem não vigia, tropeça e cai. Enquanto Jesus orava e se fortalecia em Deus, Pedro dormia e cultivava tristeza.
Lc 22.39-46 | 39 Como de costume, Jesus foi para o monte das Oliveiras, e os seus discípulos o seguiram. 40 Chegando ao lugar, ele lhes disse: “Orem para que vocês não caiam em tentação”. 41 Ele se afastou deles a uma pequena distância, ajoelhou-se e começou a orar: 42 “Pai, se queres, afasta de mim este cálice; contudo, não seja feita a minha vontade, mas a tua”. 43 Apareceu-lhe então um anjo do céu que o fortalecia. 44 Estando angustiado, ele orou ainda mais intensamente; e o seu suor era como gotas de sangue que caíam no chão. 45 Quando se levantou da oração e voltou aos discípulos, encontrou-os dormindo, dominados pela tristeza. 46 “Por que estão dormindo?”, perguntou-lhes. “Levantem-se e orem para que vocês não caiam em tentação!”
A trilha do tombo avança pela falta de oração.
3. A trilha do tombo segue o rumo da precipitação
A trilha do tombo começa no orgulho, avança pela falta de oração e segue o rumo da precipitação. Observe a atitude de Pedro.
Lc 22.47-51 | 47 Enquanto ele ainda falava, apareceu uma multidão conduzida por Judas, um dos Doze. Este se aproximou de Jesus para saudá-lo com um beijo. 48 Mas Jesus lhe perguntou: “Judas, com um beijo você está traindo o Filho do homem?” 49 Ao verem o que ia acontecer, os que estavam com Jesus lhe disseram: “Senhor, atacaremos com espadas?” 50 E um deles feriu o servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha direita. 51 Jesus, porém, respondeu: “Basta!” E tocando na orelha do homem, ele o curou.
É verdade que Jesus tinha falado da necessidade de eles levarem consigo espada (Lc 22.36-38). A arma, porém, não era para ser usada para matar outro ser humano, mas para, caso necessário, defender-se de animais ferozes e ou caçar para ter o que comer. Pedro, porém, orgulhoso e sem vigiar em oração, precipita-se e parte para a ignorância.
O apóstolo quer fazer prevalecer a vontade dele; ele perdeu sintonia com o coração de Deus; não confia na soberania de Deus sobre cada detalhe dos acontecimentos. Então, ele age precipitadamente. Age na carne.
A trilha do tombo segue o caminho da precipitação.
4. A trilha do tombo leva para longe da presença de Cristo
Orgulho, falta de oração, precipitação… O passo seguinte nesta trilha é na direção oposta à presença de Cristo. A trilha do tombo leva para longe da presença de Cristo.
Lc 22.54 | Então, prendendo-o, levaram-no para a casa do sumo sacerdote. Pedro os seguia à distância.
Pedro, que prometera seguir a Jesus até o fim, o faz, mas o faz do seu jeito, segue de longe, segue “à distância”. Gente! O apóstolo não queria deixar de seguir a Jesus, tanto que ele estava dentro da casa de Caifás, o sumo sacerdote (os demais já haviam corrido!). O problema é que Pedro seguia numa trilha distante da presença de Cristo. Pedro agora era um mero expectador.
É mais fácil seguir de longe. Quem segue de longe apazigua a consciência pelo fato de estar “seguindo”. É mais fácil seguir de longe porque de longe eu não pago um preço tão alto; de longe eu ainda posso ter o controle da minha vida; de longe eu não preciso prestar contas a outra pessoa e ainda posso usar a desculpa de que estou no caminho.
Seguir de longe é vir aos cultos quando dá ou quando for conveniente, mas depois sair de fininho; é não se envolver na vida de outros cristãos; é não permitir que outros entrem na sua vida de forma edificante; é consumir sermão sem fazer aplicação… Seguir de longe é ser um expectador.
O problema é que quem segue de longe ou “à distância” não sabe, mas está na trilha do tombo.
5. A trilha do tombo para na roda dos escarnecedores
Pobre Pedro! Começou no orgulho, faltou oração, houve precipitação, seguiu Jesus à distância e, agora, veja onde ele foi parar: na roda dos escarnecedores.
Lc 22.55 | Mas, quando acenderam um fogo no meio do pátio e se sentaram ao redor dele, Pedro sentou-se com eles.
Pedro passou a estar com os bárbaros zombadores. Sabe o que é pior? Ele parece não se importar, pois o que vemos aqui é um Pedro bem acomodado com eles, desfrutando de uma fogueira quentinha e aconchegante.
A trilha do tombo para na roda dos escarnecedores.
6. A trilha do tombo prossegue na direção da mentira
Pedro agora traz à luz o pecado. Ele foi longe demais na trilha do tombo. Agora, por causa de onde estava, o apóstolo precisava viver de mentira.
Lc 22.56-57 | 56 Uma criada o viu sentado ali à luz do fogo. Olhou fixamente para ele e disse: “Este homem estava com ele”. 57 Mas ele negou: “Mulher, não o conheço”.
Pedro não quer ser identificado como um dos discípulos, pois não está disposto a pagar o preço. Não somente isto, para não sofrer pelo nome de Cristo, ele tem a necessidade de desconstruir todo o testemunho que havia construído até aquele momento. Então, ele relativiza toda a verdade; ele mente e permanece mentindo (o verbo negar está na forma contínua) sobre si mesmo.
A trilha do tombo prossegue na direção da mentira.
7. A trilha do tombo desemboca no vale da desgraça
Tudo começou no orgulho, depois avançou para a falta de oração, seguiu o rumo da precipitação, caminhou para longe de Cristo, parou na roda dos escarnecedores, prosseguiu na direção da mentira e, como não poderia ser diferente, desembocou na desgraça. O orgulho levou à desgraça do tombo.
Lc 22.56-60 | 56 Uma criada o viu sentado ali à luz do fogo. Olhou fixamente para ele e disse: “Este homem estava com ele”. 57 Mas ele negou: “Mulher, não o conheço”. 58 Pouco depois, um homem o viu e disse: “Você também é um deles”. “Homem, não sou!”, respondeu Pedro. 59 Cerca de uma hora mais tarde, outro afirmou: “Certamente este homem estava com ele, pois é galileu”. 60 Pedro respondeu: “Homem, não sei do que você está falando!” Falava ele ainda, quando o galo cantou.
Pedro, finalmente e infelizmente, chega ao ponto de negar o Cristo.
A trilha do tombo desemboca no vale da desgraça.
O caminho de volta
Agora, alto lá! Não se precipite em condenar. Não dá para ser duro com Pedro porque todos nós somos como esse apóstolo. Vira e mexe, tomamos a trilha do tombo. Volta e meia, partimos do orgulho e seguimos todos os passos da trilha do tombo, até chegarmos ao vale da desgraça.
Qual é o caminho de volta?
Se você caiu ou está na trilha do tombo, desejo apontar o caminho de volta ao colo de Deus – lugar de onde nós nunca devemos sair.
O caminho de volta também serve para aqueles que nunca experimentaram a maravilha que é viver nos braços do Pai! Observe.
Lc 22.61-62 | 61 O Senhor voltou-se e olhou diretamente para Pedro. Então Pedro se lembrou da palavra que o Senhor lhe tinha dito: “Antes que o galo cante hoje, você me negará três vezes”. 62 Saindo dali, chorou amargamente.
Qual é o caminho de volta?
A minha oração por você é que o olhar da graça de Deus te alcance; que a Palavra da cruz te penetre; que o Espírito te leve ao arrependimento e o faça sair do vale da desgraça. Saia da trilha do tombo. Siga pelo caminho da cruz.
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